sexta-feira, 9 de março de 2018

Cesta Básica, informalidade e a análise do Banco Mundial



José Álvaro de Lima Cardoso*.
    
     O DIEESE divulgou nesta semana os resultados da Pesquisa Nacional da Cesta Básica, relativos a fevereiro, realizada em 20 capitais brasileiras. Segundo a pesquisa o custo dos 13 alimentos essenciais que compõem a Cesta, diminuiu em 13 capitais e aumentou em sete. A cesta mais cara no referido mês foi a do Rio de Janeiro (R$ 438,36), seguida por São Paulo (R$ 437,33), Porto Alegre (R$ 434,50). Florianópolis ficou na condição de quarta capital mais cara: R$ 425,05. Detalhe importante: este é o custo médio da cesta para suprir as necessidades calóricas de uma pessoa adulta, e não da família.
     Com base na cesta mais cara e considerando que a Constituição Federal determina que o salário mínimo deveria ser suficiente para suprir as despesas de um trabalhador e de sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência, o DIEESE estima mensalmente o valor do salário mínimo necessário. No mês de fevereiro o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família de quatro pessoas deveria estar em R$ 3.682,67 o que representa 3,8 vezes o salário mínimo nacional (R$ 954,00).
     Quase no mesmo dia da divulgação da Pesquisa da Cesta Básica, o Banco Mundial divulgou o um relatório sobre produtividade (“Emprego e Crescimento – A Agenda da Produtividade”) que, dentre outras coisas, afirma que o salário mínimo no Brasil teria atingido um “alto patamar” que incentivaria o aumento da informalidade. De acordo com o Banco, "As restrições das leis trabalhistas às empresas e o alto (e crescente) valor do salário mínimo têm o potencial de limitar as oportunidades de trabalho formal -- principalmente para os jovens em busca de emprego". Para a instituição salários mínimos “altos” aumentam os custos dos trabalhadores com menor qualificação, incentivando a substituição do trabalho por tecnologias que poupam mão de obra ou empurram os trabalhadores para a informalidade.
     Este tipo de análise vem sob encomenda para justificar a política de guerra que vem sendo imposta pelo golpe de Estado contra a população brasileira, especialmente a mais pobre. Como esse tipo de abordagem do Banco Mundial poderia ser levada à sério, se a Cesta Básica mencionada, suficiente para um adulto, compromete, no caso do Rio de Janeiro, metade (49,95%) do salário mínimo líquido para alimentar uma pessoa ao longo do mês? Se mesmo nas capitais mais pobres do Brasil, onde uma parcela expressiva da população vive na informalidade e com um salário mínimo por mês, a Cesta compromete quase 40% do rendimento mínimo?
     Da mesma forma, associar o valor do salário mínimo brasileiro, assim como o seu mecanismo de reajuste, à elevação da informalidade é, na melhor das hipóteses, falta total de conhecimento do que ocorreu no mercado de trabalho brasileiro até 2014. Qualquer observador medianamente atento do mercado de trabalho sabe que a primeira década dos anos 2000 foi a “década da formalização do emprego no Brasil”. Essa constatação está registrada em muitos artigos e vários livros (inclusive em livro do DIEESE). Ora, foi exatamente nesse período em que o salário mínimo nacional teve os maiores ganhos reais da história. Ocorreu, portanto, um processo simultâneo de elevação significativa do emprego formal (como nunca houve) e aumento expressivo do valor real do salário mínimo. Que ajudou inclusive a induzir o aumento real nos demais salários, como constatado pelos dados do IBGE, DIEESE e outros.  
     Um dos efeitos da obtenção de ganho real de salários (processo interrompido pela crise econômica e o golpe) foi a ampliação do nível de renda das famílias, o que levou à melhoria no perfil da distribuição de renda no Brasil até 2014. Como cerca de 75% da renda familiar advém do trabalho (PNDA-IBGE) uma elevação nos salários reais exerce efeito imediato sobre o nível de bem-estar das famílias, com efeito sobre Segurança Alimentar, Saúde, Educação e outros itens. As crises econômicas capitalistas se caracterizam pela superprodução, ou seja, a incapacidade de a sociedade consumir produtos e serviços, em decorrência do desemprego e dos baixos salários.  Nas crises convivem, de um lado, uma grande capacidade produtiva ociosa porque faltam consumidores; de outro uma porção de gente querendo consumir, mas sem dinheiro para fazê-lo.
     O que vem aumentando a informalidade no Brasil não é o valor de um salário mínimo que mal consegue comprar alimentação essencial para duas pessoas. O Banco Mundial deveria se preocupar com os fatores que, realmente estão aumentando a informalidade, e de forma veloz:
a) esvaziamento do Estado brasileiro, tirando-o do controle de setores estratégicos, inclusive, depenando o sistema de defesa nacional; 
b) destruição da indústria e aprofundamento do processo de desindustrialização;
c) o aprofundamento da internacionalizam da economia brasileira, tornando o país uma espécie de plataforma de matérias primas das multinacionais;
d) liquidação do mercado consumidor interno que, até 2014, crescera continuamente por 10 anos seguidos;
e) implantação de um ultra neoliberalismo anacrônico, liquidando a renda e às condições de vida da população brasileira, política que naufragou em todo o mundo.

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