Luiz Carlos Bresser Pereira.
Há meses que eu ouço frases como: “Quando vão chegar no Lula?”, ou
então, “Quando vão pegá-lo?”. Porque, afinal, este é o objetivo maior do
establishment brasileiro: atingir o maior líder popular do Brasil desde
Getúlio Vargas. Não porque ele seja desonesto, mas porque ele se
manteve de esquerda, porque se manteve fiel à sua classe de origem não
obstante o clássico processo de cooptação de que foi objeto. Pois bem, o
establishment chegou ao Lula. Não para incriminá-lo, mas para tentar
desmoralizá-lo.
As duas manchetes de primeira página dos dois
principais jornais de São Paulo de hoje são significativas. Na Folha
leio que “Lula é investigado por suposta venda de MPs”. Não há nada
contra o ex-presidente na Operação Zelotes, a não ser a desconfiança de
um delegado irresponsável. O que há nessa operação é o envolvimento de
grandes empresas e de seus dirigentes em um escândalo de grandes
proporções de pagamento de propinas para obterem MPs favoráveis. No
Estado, por sua vez, a manchete é “Compra de sítio foi lavrada no
escritório de compadre de Lula”. Neste caso – o do uso por Lula e sua
família de um sítio no qual construtoras se juntaram para realizar obras
sem que houvesse pagamento – o caso é mais objetivo. Lula aceitou um
presente que não deveria ter aceito.
As contribuições de empresas a
campanhas eleitorais (que até a decisão do Supremo eram legais) são
afinal presentes. Mas é impressionante como empresas dão ou tentam dar
presentes mesmo a políticos – presentes dos quais elas não esperam nada
determinado em troca; fazem parte de suas relações públicas. Eu sempre
me lembro de como tentaram reformar a piscina da casa do Ministro da
Fazenda em Brasília quando ocupei esse cargo em 1987. Minha mulher os
pôs para correr. Era o que devia ter feito Lula, que havia acabado de
sair do governo. Não o fez, e isto foi um erro político. A reforma não
aumentava seu patrimônio, apenas lhe proporcionava mais conforto. Ele
não trocou o reforma do sítio por favores às duas construtoras. Não há
nada sobre isto na investigação sobre o sítio.
O Estado brasileiro
está revelando capacidade de se defender – de defender o patrimônio
público – ao levar adiante as operações Lava Jato e Zelotes. Dirigentes
de empresas, lobistas e políticos envolvidos estão sendo devidamente
incriminados e processados. A instituição da delação premiada revelou-se
um bom instrumento de moralização. Mas está havendo abusos. Houve e
estão havendo abusos na divulgação de delações sem provas, houve abuso
em prisões cautelares ou provisórias quando não havia razão para elas. E
não é razoável o que se está fazendo com Lula. Só um clima de
intolerância e de ódio pode explicar o cerco de que está sendo vítima.
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