Negociação dos pisos em Santa Catarina: hora de virar o jogo nas negociações coletivas
*José Álvaro de Lima Cardoso
De maneira até inesperada a negociação
entre representantes das centrais sindicais, assessoradas pelo DIEESE, e
empresários catarinenses, realizada nesta terça (12/01), acabou conduzindo a um
acordo para o reajuste das 4 faixas do Piso Salarial Estadual. A negociação se
definiu já na segunda rodada, o que é raro na história dos doze anos das
campanhas pelo reajuste dos pisos estaduais. O reajuste ficou em 10,5%, na
média, um pequeno ganho em relação à inflação do ano passado (10,16%).
Ainda que o modesto ganho real não tenha
sido o almejado pelos trabalhadores, os recursos certamente serão destinados à
aquisição de bens de primeira
necessidade (comida, roupa, pequenos serviços), o que beneficia os trabalhadores,
e por extensão, toda a sociedade. Incluindo os setores do empresariado que
vivem do seu negócio e não da especulação. Esse benefício irá ocorrer, até pelo
alcance que a Lei dos Pisos Estaduais tem em Santa Catarina, onde muitos milhares
de trabalhadores atualmente referenciam seus rendimentos pelos pisos.
Segundo
a Pesquisa Industrial Anual do IBGE (PIA, do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística), o peso dos gastos de pessoal no custo total industrial está em
9,4%, incluindo salários e encargos sociais. Este é o custo do trabalho na
indústria. Claro, este custo é maior nos Serviços e Comércio, variando também a
partir do porte das empresas e outros fatores. Mas os problemas das empresas em
geral, estão localizados nos demais custos, como matéria-prima, câmbio, taxa de
juros, política industrial, fretes, etc. O custo do trabalho é solução, não só
porque produz valor novo, mas também porque são os trabalhadores,
fundamentalmente, que irão consumir os produtos fabricados. Os ricos são
minoria, não dão conta do consumo interno de um país. As crises no sistema
capitalista, há 300 anos, ocorrem quando sobram produtos nas prateleiras e não
quando faltam (havendo exceções, claro, porque o sistema se move por crises
permanentes).
Atualmente no país os dois principais
problemas macroeconômicos são inflação e baixo crescimento. O problema
inflacionário não tem nada a ver com aumento de salários. A inflação atual é causada
por custos (desvalorização do câmbio, frete, em função da política criminosa de
preços de combustíveis, etc.), nada tem nada a ver com salários. Tanto é
verdade que a fome voltou a aumentar no país, porque elevou-se o desemprego e os
salários caíram em termos reais, frutos do golpe de 2016.
Um dos principais gatilhos de aumento dos
preços em geral, possivelmente o mais importante, é o aumento extorsivo dos
preços dos derivados de petróleo. Ou seja, a política de preços da Petrobrás, a
PPI (Política de Preços de Paridade de Importação), que se baseia na
dolarização e no atrelamento do preço dos combustíveis à variação internacional
do preço do petróleo. Essa política é diretamente responsável pelo aumento dos
preços dos alimentos e, portanto, pelo acelerado retorno da fome crônica no
país. É uma política operada para encher os bolsos dos especuladores
estrangeiros, às custas da nação.
Além da inflação, o outro problema econômico
central é o baixo crescimento: os golpistas de 2016 diziam que era só tirar a presidente
Dilma para o crescimento retornar. Segundo a pesquisa Focus do Banco Central
(03/01/22), o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de 2022 não deverá
ultrapassar 0,36%. Se se confirmar essa previsão, entre 2019 e 2022 o PIB terá
um crescimento de míseros 0,5% ao ano. Este número do governo Bolsonaro só é superior
que o do governo de Michel Temer, quando houve decrescimento médio de -0,13% ao
ano, entre 2016 e 2018. Se se confirmar a previsão do PIB para este ano, da pesquisa
Focus, (0,36%), o PIB de 2022 voltará aos patamares de 2013.
O baixo crescimento durante as gestões
golpistas (Temer/Bolsonaro) decorre, em boa parte, da destruição do mercado
interno, ou seja, do arrocho salarial, do aumento do desemprego, do fim dos
ganhos reais do salário mínimo. Não se trata de teoria. Ainda está bastante
vivo em nossas memórias os efeitos virtuosos dos aumentos reais do salário
mínimo, no recente período entre 2004 a 2016. Aumento de salários,
especialmente de pisos, não é problema para o país, pelo contrário é a solução.
Quando aumenta o salário o empresário individualmente tem uma elevação
momentânea de custos, que ele tem que administrar imediatamente. Mas ele ganha
largamente, com a ampliação do mercado consumidor interno, com o aumento da
clientela.
Com a negociação dos pisos o custo da
força de trabalho (no custo total industrial) aumentou em 0,99% (10,50% sobre
9,4%) exatamente na parte do custo empresarial que produz valor novo. Máquinas
e equipamentos não produzem valor, apenas o transferem às mercadorias. A
negociação dos pisos irá proporcionar cerca de R$ 140 ou R$ 150,00 mensais,
para quem produz toda a riqueza do estado, que é o trabalhador. Trabalhador
este que, depois, irá consumir a maioria dos bens produzidos. Por que o País
está há seis ou sete anos ou em recessão ou em estagnação econômica? Porque,
dentre outras razões, o mercado consumidor está sendo destruído pelo golpe. Destruição
de direitos e de salários nunca levou a crescimento econômico em país nenhum do
mundo. Pelo contrário, se o mercado consumidor interno é destruído, aumenta a
dependência do país de mercados externos, como está acontecendo concretamente
com o Brasil.
É interessante prestar atenção no caso da
Espanha, que revogou já em 1º de janeiro a contrarreforma trabalhista que aprovaram
em 2012. Através da negociação tripartite eliminaram a legislação que só
prejudicava o Trabalho. As mudanças
trazidas pelo decreto-lei de 30 de dezembro de 2021, na Espanha, decorrem de
uma negociação que envolveu empresas, sindicatos e partidos que compõem o
governo, que dão sustentação ao Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE),
que está no comando do país. A Espanha fez a reforma trabalhista em 2012 com o
discurso de que iria gerar empregos. O país está com taxa de desemprego de
14,5% (taxa parecida com a do Brasil), uma das mais elevadas da União Europeia.
A reforma trabalhista da Espanha de uma
década atrás, foi uma das bases para a contrarreforma feita no Brasil em 2017,
sob o governo golpista de Michel Temer. Lá como aqui a desculpa era a de gerar
empregos. Da contrarreforma para cá, o número de trabalhadores sem emprego e precarizados
(informais, desempregados e desalentados) no Brasil, saltou de 52,3 milhões de
pessoas para 61,3 milhões, segundo o IBGE. Isso significa que, com a
contrarreforma, nove milhões de compatriotas, número equivalente a quase três
vezes a população do vizinho Uruguai, pioraram muito sua condição de vida e
trabalho. Estes são os fatos.
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