segunda-feira, 9 de julho de 2018

A venda da Embraer e a demolição do Brasil


                                                                                                      *José Álvaro de Lima Cardoso
    No dia 05 de julho a Embraer e a Boeing divulgaram um documento de entendimento para um acordo que cria uma empresa para a qual vão os ativos mais lucrativos para Embraer, os da aviação comercial. Nesta terceira empresa, a atual Embraer terá 20% e receberá US$ 3,8 bilhões pelo negócio. O acordo, no qual a empresa estadunidense adquire o setor comercial da empresa brasileira, foi rapidamente encaminhado para evitar que as eleições atrapalhem o negócio que entrega 80% da divisão de aviões comerciais da Embraer, para a gigante do setor aeroespacial. O detalhe relevante é que o segmento de aviação comercial representou no ano passado quase 60% da receita líquida gerada pela Embraer. 
     A Embraer foi criada em 1969, durante a ditadura militar, como empresa mista, controlada pelo Estado. Em 1994 foi vendida para o setor privado, por R$ 154,2 milhões (valor sem correção monetária). O Governo brasileiro não é acionista majoritário da Embraer, mas detém uma ação especial, chamada golden share, que lhe garante o poder de vetar decisões importantes, especialmente aquelas que podem ser consideradas lesivas ao país, como transferência de controle acionário para uma empresa estrangeira. A posse da golden share possibilita ao governo federal vetar alterações na Embraer em sete casos, incluindo transferência do controle acionário e negócios que possam comprometer os programas militares do país. O governo brasileiro, poderia, portanto, vetar o negócio. Na nova empresa que seria criada a partir do negócio, o governo brasileiro não teria golden share. Segundo informações da imprensa, os mentores do negócio estão negociando com o Supremo Tribunal Federal e com o Tribunal de Contas da União, para evitar qualquer impedimento jurídico para o negócio.
     A Embraer, apesar de ter sido privatizada em 1994, é uma empresa chave para a Defesa Nacional, além do aspecto comercialos. O seu setor de Defesa e Segurança, é extremamente sofisticado e fundamental para a estratégia nacional de defesa. A divisão de Defesa e Segurança da Embraer, formada por cinco companhias (Atech, Bradar, OGMA, Savis, Visiona), responde pela comercialização de sistemas de tráfego aéreo civis e militares, segurança digital, desenvolvimento do submarino nuclear brasileiro, Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), construção dos caças Gripen, radares de vigilância aérea e terrestre, gerenciamento do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON), etc. Com tal abrangência e profundidade nas  responsabilidades de Defesa do país, surpreende o silêncio dos militares em relação ao plano de transformar a Embraer numa divisão da Boeing mundial.
     A posição do governo brasileiro de apoio ao acordo, e o silêncio dos militares de alta patente em relação ao negócio, deve ser entendido num contexto mais geral de entrega da soberania do Brasil. As políticas do golpe seguem dois eixos principais: destruição de direitos e destruição da soberania. São dimensões diferentes, porém interligadas. Um povo sem soberania, não pode ter direitos trabalhistas e sociais, são aspectos que não combinam entre si. De um lado, estão encaminhando o enfraquecimento do Estado nacional, entregando as riquezas nacionais, destruindo as políticas de soberania energética, desmontando a Petrobrás e entregando o pré-sal, negociando as reservas estratégicas de água para as multinacionais (incluindo o Aquífero Guarani) e reduzindo o orçamento em ciência e tecnologia. De outro lado, estão desmontando as políticas de segurança alimentar e aumentando a fome, causaram a maior crise econômica da história do país, afetaram drasticamente a renda dos trabalhadores, congelaram gastos primários (como educação e saúde) por 20 anos, estão destruindo as empresas nacionais inclusive do setor privado, destruíram as leis trabalhistas, estão destruindo o que sobrou da indústria e condenando o Brasil a ser um eterno fornecedor de matérias primas para o mundo desenvolvido.
      O negócio entre Embraer e a Boeing deve ser analisado a partir do aspecto da soberania envolvido no debate. A imprensa comenta que a aliança entre Embraer e a Boeing pode chegar até aos caças Gripen, que estão sendo fabricados no Brasil, fruto do acordo assinado em outubro de 2014 entre a empresa aeroespacial sueca Saab e a Embraer. O acordo envolve a fabricação no Brasil de 36 caças, com transferência de tecnologia ao longo do processo de fabricação. A opção do governo brasileiro pelos caças suecos, em 2013, que teve como uma motivação fundamental o fato de que a Boeing não queria transferir a tecnologia de fabricação dos aviões, deixou os norte-americanos, segundo a imprensa, “muito decepcionados”. A grande mídia está falando que a companhia que será criada pela Boeing e Embraer para fabricar produtos e serviço de defesa pode ser ampliada para realizar mais do o KC-390 e chegar até o Gripen. É muito provável que um dos objetivos do negócio da Boeing com a Embraer seja interferir no acordo entre a Saab e a Embraer.
                                                                                                             *Economista.

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