terça-feira, 12 de julho de 2011

Déficit comercial das fábricas explode e vai a US$ 21,5 bi

Nos primeiros seis meses deste ano, a indústria de transformação acumulou um déficit de US$ 21,5 bilhões com o exterior  


A diferença entre as importações e as exportações revela uma escalada - ou um declínio, melhor dizendo - absolutamente impressionante. Há apenas três anos, no primeiro semestre de 2008, o saldo negativo foi de US$ 1 bilhão, enquanto em 2007 ele ainda foi positivo em US$ 11,5 bilhões.


Os dados, organizados pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) com base nas estatísticas oficiais da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), mostram que a grande briga da indústria se dá hoje nos setores de média-alta tecnologia, que reúne segmentos tradicionais e importantes da indústria brasileira, como máquinas e equipamentos, veículos, equipamentos elétricos e produtos químicos. "É nesse setor que o produto chinês está chegando e disputando espaço com o produtor nacional", diz Júlio Sérgio Gomes de Almeida, consultor do Iedi. Nesse grupo de produtos, o déficit cresceu 49% entre o primeiro semestre de 2011 e igual período de 2010 e 100% sobre 2008. Em automóveis, o crescimento do saldo negativo foi de 65% na mesma comparação.

A análise da balança industrial por setor e por intensidade tecnológica faz Almeida imaginar que no segmento de alta tecnologia o déficit brasileiro está "no limite". Ele deu um salto nos últimos anos, mas a piora, para o futuro, não será tão intensa. "A dependência tecnológica do país já é grande e o crescimento futuro vai acompanhar a demanda", diz ele. "A disputa mesmo é nos demais segmentos, especialmente na média-alta tecnologia."

Entre 2008 e 2011, o setor de média-baixa tecnologia também contribuiu para a piora do resultado da indústria, embora ele tenha melhorado no último ano, ajudado pelo resultado do setor metalúrgico (inserido no grupo produtos metálicos, na tabela). "A recuperação da exportação de aço explica esse resultado", diz Almeida. As exportações desse grupo cresceram 43%, enquanto as importações aumentaram 17,6% em relação ao primeiro semestre de 2010.

Alguns setores mostram trajetórias muito preocupantes. No primeiro semestre de 2011, o grupo representado pelas indústrias têxteis, de calçados e couro registrou um déficit comercial de US$ 495 milhões, o primeiro desse segmento, formado por tradicionais exportadores. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados) as exportações do setor recuaram 27% no primeiro semestre, enquanto as importações foram 10% maiores.

O câmbio explica uma parte expressiva desta trajetória, mas não é o único responsável. Atraso de investimentos previstos e mesmo erros de "timing" explicam a perda de espaço do fornecedor local em alguns segmentos, diz Almeida.

Há um crescente déficit no setor de refino de derivados de petróleo, por exemplo. A Petrobras atrasou investimentos em refinarias e a demanda interna de combustíveis cresceu muito pelas vendas recordes de automóveis no mercado doméstico. Como consequência, o saldo negativo na conta que inclui combustíveis importados e exportados chegou a US$ 6 bilhões no primeiro semestre deste ano - 25% acima de igual período do ano passado.

Em automóveis, diz Almeida, a importação não é mais feita apenas pelas importadoras instaladas no país em sua triangulação com a Argentina e outros fornecedores onde estão empresas-irmãs daquelas que estão instaladas no país. É crescente a participação das empresas coreanas e, mais recentemente, das chinesas. O déficit no segmento chegou a US$ 3,1 bilhões, resultado de importações 30% maiores e exportações, 20% maiores. De janeiro a maio deste ano (último dado disponível), o país importou US$ 4,2 bilhões em automóveis, 25% dos quais vindos da Coreia, que ocupa a segunda posição (atrás de Argentina), como fornecedor de carros ao país.

"Há setores produtivos perdendo competitividade de uma forma muito rápida", diz Almeida. A própria agroindústria, diz ele, não está salva desse movimento. As importações de alimentos cresceram 40% nos primeiros seis meses de 2011, enquanto as exportações evoluíram 21%. Na metodologia adotada pelo Iedi (que segue recomendações da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico-OCDE), alimentos processados, como carne, farelo de soja e suco de laranja são considerados como industrializados. Ficam na conta dos básicos, a soja em grão, o café e outros alimentos não industrializados.

Além do câmbio, observa Almeida, outros elementos afetam a competitividade da indústria e também precisam ser melhorados para reverter essa trajetória de deterioração profunda do saldo comercial brasileiro. A indústria, diz, poderia ser mais inovadora (como pretende o governo com as medidas em estudo na nova política industrial), e poderia buscar ganhos de produtividade de forma mais acelerada. Junto com esses movimentos privados, o governo poderia buscar uma melhora de "custos sistêmicos", como a desoneração da folha de salários, os gargalos de infraestrutura e a
estrutura tributária que penaliza quem agrega valor. Mesmo assim, parte da solução depende do câmbio.

O câmbio, diz Almeida, tem menos influência nos segmentos de alta-tecnologia, mas tem posição de destaque no grupo onde agora a "briga" com o importado está mais forte. Há empresas tradicionais e muito competitivas no país que não conseguem se manter competitivas com o atual nível da taxa de câmbio.
 

 
Fonte: Valor Econômico

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