sábado, 18 de abril de 2020

Quatro anos de golpe contra o povo, contra a nação, contra o trabalho



                                                                                                  *José Álvaro de Lima Cardoso

"O Brasil não é um terreno aberto onde nós iremos construir coisas para o povo. Nós temos que desconstruir muita coisa" (Jair Bolsonaro, em 18.03.2019, na sede da Agência Central de Inteligência norte-americana - CIA, em Washington).

     A atual crise do Brasil é inusitada. Combina a mais grave crise econômica mundial, com o Brasil vindo de cinco anos de estagnação/recessão e uma pandemia provocada por um vírus pouco conhecido, que já é a mais grave do último século. Toda essa confluência de crises acontece em um momento em que o Brasil possui um dos piores governos da história (o mais entreguista, o mais subserviente ao império, o mais inimigo do povo). Este governo é, fundamentalmente, resultado direto do golpe de 2016. Ele não teria se instalado sem o golpe e sem a fraude eleitoral de 2018. Hoje faz quatro anos, exatamente, que a Câmara Federal abriu o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.  Em continuidade ao processo, o Senado Federal aprovou, em 12 de maio de 2016, a admissibilidade da denúncia que pediu o afastamento da presidente da República, alegando crime de responsabilidade.
      Se tomarmos, portanto, a instalação do processo na Câmara como um marco já temos quatro anos do golpe de Estado. É evidente que se pode tomar outros períodos como referência, porque o golpe começou a ser articulado, no mínimo em 2012. Os indícios de que algo estava mudando no continente eram muito fortes. Nessa data já havia ocorrido os golpes de Honduras (2009) e Paraguai (2012). O imperialismo norte-americano estava emitindo claros sinais de que não iria mais tolerar nenhum governo progressista na região. 
     É necessário entender os fundamentos do golpe, não podemos ficar reagindo, como se fosse surpresa, a cada novo ataque do governo fascista aos direitos e à soberania. É importante entender o pano de fundo sobre o qual o processo se desenrola, do contrário, ficaremos apenas na reação à última maldade contra a população, por parte dos que estão no poder. A audácia do golpe que aplicaram no Brasil (e em vários países do subcontinente latino-americano), demonstra que os golpistas não irão entregar o poder de mão beijada para a população nos próximos anos. Bolsonaro é uma continuidade, um aprofundamento do processo. Apoiou o golpe, foi apoiado pelos golpistas, por toda a direita e, principalmente apoia e aprofunda o tempo todo o programa de guerra contra o povo. O que os golpistas fizeram em quase quatro anos não foi brincadeira:
1.Enfraqueceram o Estado nacional de muitas formas (financeiramente, politicamente, diplomaticamente, militarmente). Como é um golpe coordenado pela burguesia mais forte do planeta, contra uma país subdesenvolvido, a ideia é desmontar todo desejo que brasileiros possam ter de ser uma nação soberana;
2. Estão entregando as riquezas nacionais para o estrangeiro – o objetivo econômico central do golpe foi petróleo (que é “o golpe dentro do golpe”), mas estão de olho na Amazônia, metais de todo tipo, água, grafeno, nióbio, etc. E nas riquezas não naturais, as empresas estatais;
3. Estão destruindo as políticas de segurança alimentar e fazendo a fome aumentar exponencialmente no Brasil. Em apenas 3 anos após ter saído do Mapa da Fome da ONU (2014), o Brasil retornou para o famigerado Mapa. O fato de um país com recursos abundantes como o Brasil, ter uma parcela expressiva da população que passa fome, revela a face cruel e atrasada da burguesia brasileira;   
4. Acabaram com as políticas de soberania energética que a duras penas vinham sendo montadas. O que estão fazendo com a Petrobrás irá comprometer a segurança energética do país e está implicando na dependência externa de combustíveis. Pretendem entregar todo Sistema
Eletrobrás;
5. Estão tentando privatizar o que for possível. Venderam a Embraer a preço de banana, que virou uma divisão da Boeing. Apesar de dispor de poder para tanto, o governo dos golpistas não vetou o negócio. Pretendem privatizar o que for possível e rapidamente. Sistema Eletrobrás, Correios, Banco do Brasil, CEF estão na mira. A privatização dos Correios está planejada para o final de 2021 e pode acarretar demissões de 40.000 pessoas. Se a correlação de forças permitir, entregarão a Petrobrás também. Há 119 ativos federais listados para serem vendidos a preços de bananas;
6. Querem entregar as reservas estratégicas de água para as multinacionais, incluindo o Aquífero Guarani. Temer teve inclusive encontros com as multinacionais que controlam a água no mundo. Aprovaram uma lei em dezembro/19 que possibilita acesso às fontes de água por empresas estrangeiras;
7) Reduziram drasticamente o orçamento em ciência e tecnologia. Em 2013 o orçamento no setor foi de R$ 8,5 bilhões Em 2019 foi de 4,4 bilhões, mas cortaram 42%, ou seja, caiu para R$ 2,6 bilhões;
8) Congelaram gastos primários (como educação e saúde) por 20 anos, PEC 95, a chamada Emenda da Morte, que nem países que perderam guerras aceitaram assinar. Só em 2019 o orçamento da saúde perdeu R$ 9 bilhões por conta da emenda da morte;
9. Acabaram com a democracia, fazendo justiça seletiva através da Farsa à Jato e aumentando a repressão para cima dos movimentos sociais. Índios, sem terras e outras minorias políticas estão morrendo que nem moscas;
10. Destruíram as leis trabalhistas, e junto com elas desmontaram o mercado de trabalho e a renda. São 27,585 milhões de trabalhadores subutilizados (desempregados, subocupados, desalentados ou na inatividade por falta condições) e 12,575 milhões de trabalhadores desempregados;
11. Com o golpe explodiu a desigualdade social. Desde quando, em 1960, o IBGE passou a coletar informações sobre o rendimento da população nos censos demográficos, nunca se havia observado um crescimento tão elevado em tão pouco tempo. Índice de Gini e outros indicadores.
12. O golpe causou a maior estagnação econômica da história do Brasil. Não há registro anterior, nas contas nacionais, de cinco anos de recessão e/ou estagnação;
13. A década que se encerra em 2020, poderá ser considerada perdida para indústria. Nos últimos nove anos (2011 a 2019) a perda acumulada é de 15% na indústria. Após uns cinquenta anos, o Brasil caminha para sair do ranking dos 10 maiores países industriais do mundo;
     Se a política é de entrega das riquezas nacionais, os direitos, da mesma forma, não conseguem se sustentar. Há uma relação direta entre soberania e direitos da população. Mesmo porque uma parte das conquistas da sociedade custa dinheiro, e há que financiar com recursos públicos que, em parte são arrecadados com as riquezas que o país possui.
     Aproximação com China e Rússia, via BRICS, conquista de mercados na América do Sul e África, aposta em empresas nacionais, reanimação da indústria bélica (construção do submarino atômico e outros convencionais, em parceria com a França, a compra dos helicópteros da Rússia e dos jatos da Suécia, sempre com transferência de tecnologia), exploração soberana do pré-sal e colocação deste à serviço do povo. Tudo isso fez o Brasil entrar em rota de colisão com os interesses do imperialismo, especialmente o norte-americano. Não entender esse processo, é abdicar de compreender o que acontecerá no Brasil nas próximas décadas.

                                                                                                    *Economista.   17.04.20.                                                                      


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