O PONTO DE FUSÃO
Mauro Santayama, em seu blog.
Os
principais partidos do país - incluídos PT e PMDB - manifestaram-se,
esta semana, contra os pedidos de prisão do Presidente do Senado, Renan
Calheiros, do ex-ministro do Planejamento, Romero Jucá, e do
ex-presidente José Sarney, encaminhados pelo Procurador Geral da
República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal, com base em
telefonemas gravados pelo ex-Presidente da Transpetro, Sérgio Machado,
e “vazados” por O Globo.
Entre as razões citadas, está a
alegação da possibilidade de crime de obstrução de justiça, porque os
três - que são legisladores, para isso escolhidos pelo voto popular -
teriam discutido a aprovação de leis para impedir que acordos de delação
premiada sejam feitos com pessoas já detidas e para alterar a
determinação - claramente promulgada sob pressão do clamor popular - que
prevê prisão após a condenação já na segunda instância.
A
verdade é que não se pode mais esconder o fato de que o que está
acontecendo é um embate, claro, entre o presidencialismo de coalizão e a
Democracia - que, com todos os seus defeitos costumeiros, comuns a
todas as nações em que ocorre, ainda é, como dizia Churchill, o melhor
sistema possível, baseado na incontestável legitimidade do voto - e
setores da plutocracia que pretendem se erguer sobre os três poderes da
República, ignorando, ou fingindo ignorar, tanto a História quanto a
proeminência lógica, constitucional, da política sobre certas carreiras
de estado.
Qualquer cidadão, e, principalmente, os seus
representantes, têm o direito de discutir o que quer que seja, e de
propor a mudança legislativa que quiser, principalmente quando leis e
outros procedimentos podem estar ameaçando o direito de opinião, a
liberdade individual, ou o Estado de Direito.
A reação dos
partidos à atitude do Procurador Geral, pode e deve, representar, o
ponto de fusão resultante da pressão exercida sobre homens públicos de
todas as tendências e partidos, nos últimos meses, e levar -
independente das diferenças políticas e ideológicas - a uma reação em
cadeia contra o que está ocorrendo, antes que seja tarde.
Se
houvesse bom senso por parte do Ministério Público, bandidos notórios,
eleitos ou não, que se locupletaram comprovadamente com dinheiro
público, detentores de contas no exterior, e que gastaram milhares de
dólares por dia em nababescas viagens com a família, já estariam presos
há meses, e conversas políticas, ainda que gravadas, seriam reduzidas ao
que são: meras conversas políticas.
Tudo isso é fruto de uma
situação absurda, surreal, em que não se reagiu logo no início, e na
qual, no lugar de trabalhar para promover a volta da governabilidade -
sabe-se lá por que razão, talvez para lançar um candidato próprio -
parte da mídia tomou, conscientemente, a decisão de martelar,
exaustivamente, a tese de que o país está quebrado - quando saímos da
décima-quarta para a oitava economia do mundo em pouco mais de 10 anos,
temos quase um trilhão e quinhentos bilhões de reais em dólares, em
caixa, em reservas internacionais, e somos o quarto maior credor
individual externo dos EUA;
E de provar que todo o universo
político-partidário, sem exceção, é corrupto, e deve ser destituído ou
preso, baseando-se em duas premissas absolutamente frágeis: delações
premiadas fechadas sob pressão após a prisão dos delatores, que raras
vezes se apoiam em provas claras e irrefutáveis; e uma série de
gravações de aúdio ou escutas telefônicas que até as pedras sabem que
não se sustentam, moral ou judicialmente, como provas, porque foram
preventiva, premeditada e intencionalmente feitas e manipuladas, por uma
das partes, tanto do ponto de vista do tema, como da condução da
conversa, com o intuito de comprometer o interlocutor e de livrar quem
as gravou de ser acusado e detido, em um clima digno do Terror
Estalinista - em que todo mundo acusa todo mundo das coisas mais
estapafúrdias e rocambolescas - na tentativa de não ser massacrado no
moinho permanente de um esquema galopante, arbitrário, kafkiano e
inconstitucional.
Depois de sangrar umas às outras da forma mais
imbecil e suicida, abrindo a Caixa de Pandora da mais rasteira e
hipócrita criminalização da política, as lideranças partidárias precisam
entender que as diferentes agremiações têm que se reunir em urgente
aliança, em defesa da liberdade e dos sufrágios de seus eleitores, e
alterar a Constituição, se necessário for, para retomar o controle do
país, que está sendo usurpado, na prática, por segmentos do Estado que
têm cada vez mais poder, mas - paradoxalmente - nem um voto.
É
preciso exigir do Judiciário e do Ministério Público que se prove,
irrefutavelmente, a enorme massa de afirmações que têm sido feitas por
pseudo-delatores para se livrar de prisões arbitrárias e ilegais, já há
mais de 2 anos.
Onde estão as dezenas de bilhões de reais que se
afirma - ou melhor, se propaga, à boca pequena, há meses - que foram
surrupiados à Petrobras?
Quais são os nomes das pessoas que, nas
várias comissões de licitação da empresa, tornaram possíveis esses
supostos desvios e sobrepreços, na fantástica escala que circula às
vezes na imprensa, e quase sempre nas redes sociais?
O que elas receberam em troca da viabilização desses supostos crimes?
Por que elas não foram identificadas e processadas até agora?
Em que contas foram depositadas as “comissões” e “propinas”, e em que montante?
Que documentos - não ilações condicionais e subjetivas - comprovam esses ilícitos ?
Uma
coisa é o desvio feito por bandidos, que se locupletaram de dinheiro
sujo, para gastar a tripa forra, em verdadeiras farras do boi, no
exterior.
Outra, financiamentos empresariais, feitos para
viabilizar a campanha de diferentes partidos, e registrados com todas as
letras, na forma da lei, no passado, que estão sendo transformados,
agora, como por passe de mágica, em propinas.
É isso - e não
uma longa sucessão de "disse me disses" e vazamentos seletivos e
distorcidos, seguindo as conveniências de momento de quem os facilita -
que é preciso ser apresentado ao público.
É imprescindível que prevaleça, e seja re-proclamada, aos quatro ventos, a ideia maior que abre a Carta Constitucional.
Todo poder precisa emanar do povo e é em seu nome que ele deve ser exercido.
Chega
de boato, manipulação, hipocrisia, mentira e mistificação dos fatos,
com o objetivo de desconstruir a Política e a Democracia aos olhos da
população, para abrir caminho à alternativa fascista de sedutoras
vestais, travestidas de heróis de Polichinelo e de "salvadores" da
Pátria.
O processo de construção e de aprimoramento do sistema
democrático - e, por extensão das instituições do Estado, que não podem
ficar à margem de controle ou aprimoramento - pode, por natureza, ser
permanente, árduo, paulatino e, até mesmo, estar longe de ser
perfeito, mas deve ser conduzido por quem de direito, devidamente
ungido pelo sagrado voto popular.
Até mesmo porque a Democracia é
um processo nunca acabado de constante busca do equilíbrio possível
entre diferentes tendências, grupos, opiniões, corporações, dentro de
uma determinada comunidade, sociedade, nação ou território.
Atalhos
e soluções rápidas, populistas, arrogantes e intempestivas, formuladas
de modo amador e superficial, na tentativa de reformar o mundo, mesmo
que revestidas, supostamente, das melhores intenções, como fez a Emília
do Sítio do Pica-Pau Amarelo, costumam, no mundo real, levar a perigosos
e quase sempre trágicos e sangrentos desvios, que conduzem ao estupro
da liberdade e da dignidade humanas e a gravíssimos retrocessos
históricos, políticos, econômicos e institucionais.
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