terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Não a “Uma ponte para o futuro” do PMDB[1]




Juliano Giassi Goularti
Doutorando em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da UNICAMP

            Sem paralelo na história republicana, nos últimos dez anos a política econômica do governo federal propiciou uma melhoria significativa do quadro social. Enquanto a economia mundial se encontrava à deriva, puxado pelo Estado, a economia brasileira imprimia uma prática social-desenvolvimentista. Há décadas não se observava uma desenvoltura na formulação de políticas industriais, expansão da infraestrutura e pautas sociais progressistas como elevação do salário mínimo e distribuição de renda. Porém está em campo uma reação conservadora nucleada pelos interesses da ortodoxia representada pelo conteúdo programático “Uma ponte para o futuro” do PMDB. Se é grave aceitar esse projeto malévolo, mais grave ainda é pagar o preço pelo desastre da economia e pelo abismo social caso o programa do PMDB seja assumido como compromisso pelo governo. Em síntese, a ponte do PMDB prima pela ortodoxia e dinamita as conquistas da Constituição de 1988.
O que é necessário para dizer efetivamente não à ortodoxia e ao abismo social e criar condições para que os direitos sociais garantidos pela Constituição de 1988 e conquistado pela população de baixa renda nos últimos dez anos não sejam retirados? Em primeiro lugar ninguém de bom senso e um mínimo de espírito público pode aceitar que a ortodoxia seja a solução para os problemas brasileiros em face da crise. Em segundo ignorar a proposta “Uma ponte para o futuro” do PMDB que propõe a desvinculação dos recursos do sistema de financiamento da saúde e da educação, desindexação do salário mínimo[2] e privatização para reduzir o tamanho do Estado. Do contrário será uma ponte para o abismo! Em terceiro restabelecer a heterodoxia recuperando os instrumentos de ação da política econômica estabelecendo um programa de investimentos públicos coordenados que desperte o investimento privado e reanime a demanda efetiva. Em quarto, aprovar uma reforma fiscal e tributária progressiva, que possa readequar as contas públicas, e equacionar a dívida pública para permitir o crescimento econômico acelerado e um maior avanço social, e por último, maior integração comercial com a América Latina e outros países periféricos.
O desafio com que o governo federal se defronta é substituir as rodas do trem em plena marcha. Superar a crise política que se arrasta e orientar a política econômica para solucionar nossos problemas estruturais de ordem social e econômica trata-se de condição necessária para corrigir os rumos da economia. A reconstrução dos instrumentos de política que concilie o social e o econômico é seguramente a tarefa mais urgente. A falácia da postura ortodoxa do governo sobre a batuta de Joaquim Levy[3] e o documento “Uma ponte para o futuro” do PMDB ampliam o fosso da crise e restringe consideravelmente a autonomia de ação política do Estado. Lastimavelmente a criação de um clima de crise fiscal e econômica ganhou a batalha esse ano. Porém como pode um país como o Brasil que gerou superávit por mais de uma década e num único ano apresentou déficit de 0,6% do PIB estar em crise aguda? O que dizer de países como EUA, Reino Unido, Irlanda, Espanha, Portugal, Grécia e Japão que desde 2009 apresentam déficits elevadíssimos?
Para afastar o clima de crise não é suficiente afastar-ser da tutela da Ponte do PMDB. Caso o governo federal não tome a iniciativa de definir soberanamente uma política cíclica, a ortodoxia ocupará sem tardança o espaço vazio. Não é sem razão que os economistas ortodoxos estão ganhando mentes e corações vazios, exemplo é o cardápio sugerido por Armínio Fraga. E a crise política que contaminou a economia está sendo uma oportunidade para a ortodoxia reforçar seus vínculos políticos com a sociedade. Considerando que nossa economia está em crise, cabe o governo Dilma reconhecer que a ortodoxia num passado não muito distante ao encarar as sucessivas crises dos anos noventa tratou de aprofunda-lá a ponto de aumentar o número de pobres e miseráveis. Basta uma retrospectiva para constatar que o tripé econômico responsabilidade fiscal, sistema de metas de inflação e taxa de câmbio flutuante que sustentou o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso produziu uma situação insustentável das finanças públicas e levou a economia para o abismo econômico e social.
Se a situação econômica e social gestada na década de noventa privou uma geração de acesso aos direitos sociais básicos, os doze anos de Lula e Dilma o Brasil saiu do mapa da fome. Mas as políticas de austeridade adotadas em 2015 estão empurrando o país para uma das maiores recessões de sua história, correndo o risco de colocar novamente uma geração na situação de vulnerabilidade social. O caminho para superar a presente situação de crise da economia nacional não é voltar ao passado inglório. Mas sim preservar a inclusão social ocorrida nos últimos anos é a defesa intransigente dos direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988. Para isso é preciso construir um amplo pacto social e político de centro-esquerda para interromper a queda livre da economia que se ensaia para os próximos três anos, pois do contrário quem pagará o pato, como sempre, são os trabalhadores.


[1] Documento lançado pela Fundação Ulysses Guimarães do PMDB em 29 de outubro de 2015.
[2] A política de valorização do salário mínimo leva em conta a inflação passada e o desempenho da economia dos dois últimos anos.
[3] O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, substituiu o ministro Joaquim Levy em 18 de dezembro de 2015.



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