Juliano
Giassi Goularti
Doutorando
em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da UNICAMP
Sem paralelo na história republicana, nos últimos dez anos a política econômica
do governo federal propiciou uma melhoria significativa do quadro social.
Enquanto a economia mundial se encontrava à deriva, puxado pelo Estado, a
economia brasileira imprimia uma prática social-desenvolvimentista. Há décadas
não se observava uma desenvoltura na formulação de políticas industriais,
expansão da infraestrutura e pautas sociais progressistas como elevação do
salário mínimo e distribuição de renda. Porém está em campo uma reação
conservadora nucleada pelos interesses da ortodoxia representada pelo conteúdo
programático “Uma ponte para o futuro” do PMDB. Se é grave aceitar esse projeto
malévolo, mais grave ainda é pagar o preço pelo desastre da economia e pelo
abismo social caso o programa do PMDB seja assumido como compromisso pelo
governo. Em síntese, a ponte do PMDB prima pela
ortodoxia e dinamita as conquistas da Constituição de 1988.
O que é
necessário para dizer efetivamente não à ortodoxia e ao abismo social e criar
condições para que os direitos sociais garantidos pela Constituição de 1988 e
conquistado pela população de baixa renda nos últimos dez anos não sejam
retirados? Em primeiro lugar ninguém de bom senso e um mínimo de espírito
público pode aceitar que a ortodoxia seja a solução para os problemas
brasileiros em face da crise. Em segundo ignorar a proposta “Uma ponte para o futuro” do PMDB que propõe a desvinculação dos
recursos do sistema de financiamento da saúde e da educação, desindexação do
salário mínimo[2]
e privatização para reduzir o tamanho do
Estado. Do contrário será uma ponte para o abismo! Em terceiro
restabelecer a heterodoxia recuperando os instrumentos de ação da política
econômica estabelecendo um programa de investimentos públicos coordenados que
desperte o investimento privado e reanime a demanda efetiva. Em quarto, aprovar
uma reforma fiscal e tributária progressiva, que possa readequar as contas
públicas, e equacionar a dívida pública para permitir o crescimento econômico
acelerado e um maior avanço social, e por último, maior integração comercial
com a América Latina e outros países periféricos.
O desafio
com que o governo federal se defronta é substituir as rodas do trem em plena
marcha. Superar a crise política que se arrasta e orientar a política econômica
para solucionar nossos problemas estruturais de ordem social e econômica
trata-se de condição necessária para corrigir os rumos da economia. A reconstrução dos instrumentos de política que concilie
o social e o econômico é seguramente a tarefa mais urgente. A falácia da
postura ortodoxa do governo sobre a batuta de Joaquim Levy[3]
e o documento “Uma ponte para o futuro” do PMDB ampliam o fosso da crise
e restringe consideravelmente a autonomia de ação política do Estado. Lastimavelmente a criação de um clima de crise
fiscal e econômica ganhou a batalha esse ano. Porém como pode um país como o
Brasil que gerou superávit por mais de uma década e num único ano
apresentou déficit de 0,6% do PIB estar em crise aguda? O que dizer de
países como EUA, Reino Unido, Irlanda, Espanha, Portugal, Grécia e Japão que
desde 2009 apresentam déficits elevadíssimos?
Para
afastar o clima de crise não é suficiente afastar-ser da tutela da Ponte do
PMDB. Caso o governo federal não tome a iniciativa de definir soberanamente uma
política cíclica, a ortodoxia ocupará sem tardança o espaço vazio. Não é sem
razão que os economistas ortodoxos estão ganhando mentes e corações vazios,
exemplo é o cardápio sugerido por Armínio Fraga. E a crise política que
contaminou a economia está sendo uma oportunidade para a ortodoxia reforçar
seus vínculos políticos com a sociedade. Considerando que nossa economia está
em crise, cabe o governo Dilma reconhecer que a ortodoxia num passado não muito
distante ao encarar as sucessivas crises dos anos noventa tratou de
aprofunda-lá a ponto de aumentar o número de pobres e
miseráveis. Basta uma retrospectiva para constatar que o tripé econômico
responsabilidade fiscal, sistema de metas de inflação e taxa de câmbio
flutuante que sustentou o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso
produziu uma situação insustentável das finanças públicas e levou a economia
para o abismo econômico e social.
Se a situação econômica e social gestada na década de noventa privou uma
geração de acesso aos direitos sociais básicos, os doze anos de Lula e Dilma o
Brasil saiu do mapa da fome. Mas as políticas de austeridade adotadas em 2015
estão empurrando o país para uma das maiores recessões de sua história,
correndo o risco de colocar novamente uma geração na situação de
vulnerabilidade social. O caminho para superar a presente situação de crise da
economia nacional não é voltar ao passado inglório. Mas sim preservar a
inclusão social ocorrida nos últimos anos é a defesa intransigente dos direitos
assegurados pela Constituição Federal de 1988. Para
isso é preciso construir um amplo pacto social e político de centro-esquerda
para interromper a queda livre da economia que se ensaia para os próximos três
anos, pois do contrário quem pagará o pato, como sempre, são os
trabalhadores.
[2] A política de
valorização do salário mínimo leva em conta a inflação passada e o desempenho
da economia dos dois últimos anos.
[3] O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa,
substituiu o ministro Joaquim Levy em 18 de dezembro de 2015.
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