terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Lava Jato, conspiração para rapinar e liquidar o Brasil

 

                                                                                  *José Álvaro de Lima Cardoso

 

     Por estes dias foram feitas novas revelações da Lava Jato, a partir de mensagens aprendidas durante a operação Spoofing, a qual a defesa do ex-presidente Lula teve acesso. Estas últimas revelações tornam ainda mais evidente o que a gente já sabia da operação desde o primeiro dia: a Lava Jato foi uma trama organizada pelos EUA, com vários objetivos, sendo que um dos principais era tirar a esquerda do poder e colocar uma pessoa servil subserviente a eles na chefia de governo. A operação foi fundamental para perpetrar o golpe em 2016 e fraudar as eleições de 2018, com uma acusação falsa para tirar Lula das eleições, elegendo Bolsonaro.

     Os diálogos revelados, revelam a sordidez e a baixeza dos que comandavam a operação. Tiveram postura completamente criminosa, utilizando o cargo público para cometer crimes, angariar vantagens pessoais, e enganar todo o país. Num dos diálogos, ocorridos em 23 de fevereiro de 2016, o chefe da operação, Deltan Dallagnol combina com Sérgio Moro como montaria uma das denúncias contra Lula. Na conversa, Dallagnol mostra sua receita de criminalização de Lula e é orientado por Sérgio Moro. A conduta desses cidadãos foi o tempo todo criminosa.

     Na falta de provas, pressionavam o executivo preso para que dissesse que a palestra ou a doação foi uma compensação pelo contrato recebido do governo. Com um processo de golpe em pleno andamento, com mídia, STF, Congresso, forças armadas, todos apoiando o golpe, não havia necessidade de provas. Não haviam documentos bastava a palavra da testemunha, disposta a dizer qualquer coisa para se livrar da prisão em Curitiba, também conhecida como a “Guantánamo de Curitiba”.

     Em 2014 era difícil afirmar que a operação Lava Jato pretendia inviabilizar a esquerda no poder, assim como a destruição da economia do país, visando submetê-lo à financeirização radical, com destruição dos direitos, e empresas. Havia muita resistência, a propaganda era muito pesada. Hoje a população já admite que houve golpe, principalmente pelo que os governos Temer e Bolsonaro fizeram com os direitos e com a soberania.

    O genocida que está no poder é consequência, mais ou menos imperfeita, da operação Lava Jato. Bolsonaro é fruto do golpe de 2016, combinado com a fraude eleitoral de 2018. A burguesia que operou o golpe em 2016 ficou sem candidato viável eleitoralmente em 2018, e teve que descarregar seus votos em Bolsonaro. Na falta de um candidato “puro sangue”, que fosse eleitoralmente viável tiveram que apoiar um candidato de extrema direita, do chamado baixo clero, com uma trajetória parlamentar absolutamente medíocre.  

     É claro que, se o país não estivesse andando em “modo golpe”, ou seja, se houvesse normalidade no funcionamento das instituições (STF, Forças Armadas, Congresso nacional, Assembleias Legislativas, Polícia Federal), já as denúncias do site The Intercept em 2019, teriam que reverter todas as consequências do que aconteceu no país, a partir do golpe de 2016, incluindo a eleição de Bolsonaro e as condenações de Lula, obviamente. Isso não acontece porque os golpistas continuam movimentando os cordões do poder.

     Algo que tornou evidente em 2014, que a Lava Jato representava um ataque contra a soberania nacional, foi o fato de que o seu alvo principal, desde o início, foi a maior empresa da América Latina, e motor da economia brasileira, a Petrobrás. O ataque à Petrobrás era econômico e político. Como principal instrumento do golpe de 2016, a Lava Jato é responsável pelo arrocho de salários, pela explosão da pobreza, pela aceleração da taxa de desemprego, pelos piores governos da história, pela ascensão das canalhas fascistas, pela privatização da água, pela maior recessão da história do pais. 

      O alvo central da operação, a Petrobrás, foi cuidadosamente escolhido pelos estrategistas do golpe.  A maior empresa da América Latina, produzia em 2013, 2,6 milhões de barris de petróleo diários, tinha uma força de trabalho de mais de 100 mil trabalhadores, operava em 25 países, tinha um lucro de R$ 23,6 bilhões e era a 13ª maior companhia de petróleo do mundo no ranking da revista Forbes. Era uma empresa (ainda é, não conseguiram destruir) maior do que a economia de muitos países do mundo. Como alguém falou a alguns anos: "a Petrobrás é uma outra nação. Felizmente é uma nação amiga."

     Um dos grandes ensinamentos do atual processo golpista é o de que quando o inimigo é extremamente forte (no caso o império norte-americano), é surpreendente como aparecem “aliados” internos para apoiá-lo. Em 2014 era difícil mencionar, nos debates que Sérgio Moro e Dallagnol eram traidores da pátria. Havia forte reação. Os procuradores da Lava Jato eram tão idiotas, que, incensados pelo jogo da mídia, assumiam postura, e se achavam, verdadeiros heróis. Como sabemos hoje, Dallagnol, Sérgio Moro e os outros, são “patriotas” do mesmo naipe do Bolsonaro: batem continência para a bandeira dos EUA.

     Uma das ironias do golpe no Brasil foi que a direita organizou um movimento contra a corrupção, movimentando muito dinheiro dos irmãos Kock, das multinacionais do petróleo, contra corrupção: tiraram uma pessoa que não cometeu nenhum crime de responsabilidade, que até os fascistas admitem que é honesta, e levaram ao núcleo de poder uma das maiores quadrilhas de gatunos já registradas na história do Brasil.  

     Os vazamentos seletivos da Lava Jato, sempre contra símbolos populares e tudo que significasse promoção do Brasil, somado a um trabalho da grande mídia, despertaram uma reação histérica da classe média, que já tinha sido verificada em outros momentos, como no golpe que levou ao suicídio de Getúlio Vargas, em 1954. Tal reação, de caráter extremamente preconceituoso e intolerante, desferida contra tudo que pudesse sugerir a soberania do Brasil, foi mais uma demonstração, sem maquiagem, do caráter entreguista e antinacional da Lava Jato.

      A Lava Jato foi claramente uma operação contra a soberania do Brasil, fato que a história tornará cada vez mais cristalino (para a história, 7 anos não significam nada). A Lava Jato foi a ponta de lança do país imperialista mais perigoso e beligerante do mundo, que atravessa uma crise brutal, contra qualquer ilusão de projeto nacional de desenvolvimento do Brasil.

      A comprovação da atuação, e interesse, dos EUA no golpe são dimensões fundamentais da compreensão do turbilhão de acontecimentos ocorridos no Brasil nos últimos oito ou nove anos. Sem o conhecimento e a concatenação desses complexos fatos, é muito difícil entender o Brasil dos dias atuais. Assim como ocorreu em 1954, 1964, e em outros golpes contra o povo brasileiro, entre os principais grupos de interesses no golpe de 2016, o principal é o do Império. Isso é fundamental entender.

     Em 2017 o fundador do Wikileaks Julian Assange, revelou que as espionagens feitas pela NSA (Agência Nacional de Segurança dos EUA), à presidenta da República, outros membros do governo brasileiro, e à Petrobrás, estavam relacionadas diretamente a interesses políticos e econômicos, especialmente os do petróleo. Nada disso adiantou, o golpe já estava em marcha, com o apoio dos grandes meios de comunicação. Os Estados Unidos para continuar na condição de potência, depende crescentemente dos recursos naturais da América Latina e, por esta razão, não quer perder o controle político e econômico da região. A estratégia norte-americana tem caráter subcontinental, praticamente todos os países da América do Sul sofreram golpes, adaptados a cada realidade social e política. Na maioria dos países foram ataques desferidos sem participação aberta das forças armadas (que atuaram nos bastidores), utilizando os grandes meios de comunicação, parcela do judiciário e políticos da oposição para sacramentar o processo.

     Durante os governos Lula e Dilma, o Brasil tomou iniciativas que desagradaram ao Império: aproximação com os vizinhos sul-americanos, fortalecimento do Mercosul, organização do BRICS, votação da Lei de Partilha, projeto de fabricação de submarino nuclear em parceria com a França, etc. O entreguismo e a voracidade com que os governos pós-golpe de 2016 começaram a se desfazer dos ativos da Petrobrás, foi um sintoma muito forte que o petróleo era a principal motivação econômica do golpe.  Mas o interesse dos EUA no golpe, como se percebeu em seguida à tomada de poder pelos golpistas, está relacionado também às reservas de água existentes na região, aos minerais, toda a biodiversidade da Amazônia, e a posições estratégicas do ponto de vista militar (como vimos, Bolsonaro apressou-se em entregar base de Alcântara).

     Uma potência na América do Sul e ligada comercial e militarmente à China e à Rússia é tudo o que os Estados Unidos não querem. Por isso promoveram um processo arriscado de golpe no Brasil, que até agora ainda não se “acomodou”. Não por acaso também, dentre as dezenas de ações destrutivas dos golpistas, uma das primeiras foi prender o Almirante Othon da Silva, coordenador do projeto nuclear do Brasil, e alvejar o projeto de construção do submarino de propulsão nuclear, fundamental para a guarda e segurança da chamada Amazônia Azul. O almirante Othon concebeu o programa do submarino nuclear brasileiro e foi o principal responsável pela conquista da independência na tecnologia do ciclo de combustível, que colocou o Brasil em posição de destaque na matéria, no mundo. O militar, que recebeu todas as honrarias possíveis das forças armadas brasileiras, é considerado um patriota e herói brasileiro. A história irá nos esclarecer ainda muita coisa, pois os acontecimentos são muitos recentes e muitos detalhes ainda serão esclarecidos.

        É certo que não foram ineptos procuradores golpistas, ou um juiz medíocre de primeira instância - ambos os grupos em busca de fama e dinheiro, como mostraram mais uma vez as denúncias recentes - que destruíram, sozinhos, o setor de engenharia nacional e colocaram o almirante Othon Silva na cadeia.  Assim como não foram os operadores visíveis da Lava Jato que colocaram na cadeia, cometendo as maiores atrocidades legais, alguns dos maiores capitalistas do país, proprietários de empresas que investiam em todos os continentes, como Marcelo Odebrecht. Só tem um poder que está acima desse, que é o imperialismo norte-americano. A capacidade de articular interesses, o financiamento e as técnicas fornecidas pelo imperialismo foram essenciais para o sucesso do golpe.  

     O Brasil hoje é uma espécie de colônia dos países imperialistas e a crise no sistema político, em boa parte, reflete isso. Com os quatro anos de golpe eles conseguiram fazer uma destruição que parece que já tem 40 anos. A polarização política existente, por sua vez tende a piorar muito porque os golpistas não têm proposta consequente para enfrentar a crise econômica. A polarização é fruto de dois aspectos centrais: a) piora muito profunda da vida do povo; b) consequente incapacidade de “acomodar” a situação política. Afinal quem está disposto a morrer de fome sem lutar? 

 

                                                                                     Economista. 02.02.2021.

 

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