terça-feira, 10 de março de 2020

As políticas anti crescimento do governo


                                                                   
                *José Álvaro de Lima Cardoso
    
     Conforme as contas nacionais, a economia brasileira cresceu meros 1,1% em 2019, desempenho inferior aos observados no primeiro governo do golpe de 2016, Temer, quando a economia brasileira cresceu 1,32% (2017) e 1,31% (2018). A gestão Bolsonaro/Guedes conseguiu piorar a economia em relação ao governo Temer, que já foi muito ruim. Pelo lado da demanda, o consumo das famílias expandiu 1,8% ao longo do ano passado, o pior desempenho em três anos. Esse item, que tem o maior peso na composição do PIB (64,9%), havia apresentado uma elevação de 2% em 2017 e de 2,1% em 2018. Os dados do PIB mostraram uma indústria de transformação estagnada (“crescimento” de 0,1%) e taxa de investimentos (Formação Bruta de Capital Fixo), de 15,4% do PIB, praticamente parada também, em relação aos anos anteriores.
     Com estes resultados ficou difícil para os economistas oficiais e porta vozes dos banqueiros, sustentarem a hipótese de que a economia estaria retomando, após a gravíssima recessão de 2015/2016. Segundo a referida teoria (que é um tipo de “conto de fadas”), o capital externo estaria retornando, o emprego formal viria numa trajetória de recuperação, o que tenderia a reanimar demais indicadores econômicos, especialmente os de crescimento do produto. Face aos números das contas nacionais, a expectativa inicial de crescimento de 2% do PIB para este ano, ficou mais uma vez otimista e está sob revisão - sempre para baixo.
     Um dos aspectos que não deu certo no golpe perpetrado em 2016, do qual Bolsonaro representa um aprofundamento, é que a essa altura a economia deveria estar crescendo a patamares superiores aos verificados antes do acontecido. Nós, economistas ligados aos movimentos de trabalhadores, não dispomos de informação privilegiada, de bastidores, do que estão pensando os grandes capitalistas que atuam no Brasil, sobre os temas nacionais. Nossas fontes de informações são as públicas, para o bem e para o mal. Como a mídia comercial é dominada pelos capitais, tais informações devem sempre ser filtradas com espírito crítico e perspicácia.
     Em função do anteriormente colocado, devemos prestar atenção não no que os grandes capitalistas estão dizendo, e sim no que estão fazendo. No ano passado, a saída líquida de dólares da economia brasileira (entradas menos saídas) foi de US$ 44,77 bilhões, maior evasão de divisas do Brasil em toda a série histórica, iniciada em 1982, até então. Neste ano, os especuladores estrangeiros já retiraram até o momento, do mercado de ações, R$ 34,9 bilhões. Por dia de pregão da bolsa, neste ano, são R$ 918 milhões a menos de investimento estrangeiro, contra um ritmo de evasão, em 2019, de R$ 179,5 milhões. Para termos uma ideia do que essa saída significa, em 2008, que era até então o ano de maior saída de estrangeiros em termos reais (ou seja, corrigidos pela inflação), a retirada, em média por pregão, foi de R$ 180 milhões.
     Parte da mídia atribui a instabilidade da economia brasileira às sandices que Bolsonaro e sua equipe falam cotidianamente. Mesmo reconhecendo o absurdo das mesmas, sabe-se que essa não é a questão fundamental, o problema tem fundamentação econômica. O país não cresce e nem irá crescer porque as políticas desenvolvidas por este governo são anti crescimento. Por exemplo, desde o golpe destruíram o mercado consumidor interno com uma série de medidas, principalmente aumentando o desemprego e a precarização, e levando os indicadores de pobreza a explodirem. Como o país irá crescer se aumenta o número de pessoas que passam fome, com a destruição de políticas de combate à fome e com aumento da precarização e desemprego? O orçamento do Bolsa Família terá 3 bilhões de reais a menos que em 2019, quando foi registrado o menor número de beneficiados, em oito anos. Em 2019 foram desligadas 900 mil famílias, enquanto permanecem na fila 3,5 milhões de desassistidos. Neste caso é uma mistura de crueldade com burrice, pois, cada 1 real gasto com o Bolsa Família rende 1,78 real para a economia como um todo.
     Ademais estão entregando as riquezas nacionais, o mais rápido que podem para os capitais estrangeiros e querem vender a preço de banana. O objetivo econômico central do golpe foi petróleo (que é “o golpe dentro do golpe”).  Mas estão de olho na Amazônia, metais de todo tipo, nióbio, grafeno, água, etc. E também querem as riquezas não naturais, ou seja, as estatais. Estão tentando privatizar o máximo de estatais. A contribuição que a Embraer fornecia ao crescimento, por exemplo, praticamente foi anulada, na medida em que foi vendida à preço de banana (US$ 4,7 milhões), e que virou uma divisão da Boeing. Estão na mira o Sistema Eletrobrás, Petrobrás, Correios, Banco do Brasil, CEF.  Além das privatizações significarem demissões, muitas vezes em massa, suas estratégias serão colocadas a serviço de interesses dos seus compradores, regra geral, grandes multinacionais
     Como o país irá crescer se congelaram os gastos com a população por 20 anos, através da Emenda Constitucional 95, a chamada Emenda da Morte? Nem países que perderam guerras mundiais aceitaram assinar leis dessa natureza, que impedem o país de fazer políticas públicas. De 2017 para cá educação e saúde perderam bilhões em investimentos (só em 2019 o orçamento da saúde perdeu R$ 19 bilhões).
     É muito difícil um país crescer, se as leis trabalhistas são destruídas e o mercado de trabalho é desarticulado. Um dos efeitos das políticas do golpe são 27,585 milhões de trabalhadores subutilizados (desempregados, subocupados, desalentados ou na inatividade por falta condições), que afeta diretamente o mercado consumidor. Não por acaso, o consumo das famílias (item com maior peso na composição do PIB) expandiu meros 1,8% ao longo do ano passado, o pior desempenho em três anos.
     Como o país vai retomar se crescimento, se a política é de destruição da indústria, se a década que se encerra em 2020, poderá ser considerada perdida para a indústria? Após uns cinquenta anos, o Brasil caminha para sair do ranking dos 10 maiores países industriais do mundo. Há uma relação direta entre crescimento, soberania nacional e direitos da população. Uma parte das conquistas da sociedade custa dinheiro e tem que ser financiada com recursos públicos que, em parte são arrecadados com as riquezas que o país possui. Se são vendidos ativos ligados ao setor de petróleo por uma fração do efetivo valor, fica difícil sobrar recursos para financiar a Seguridade Social.
     Com esse conjunto de políticas, que representa um verdadeiro lança chamas contra a população trabalhadora, o país só conseguiria crescer se houvesse uma conjuntura internacional muito específica, na qual o mundo estivesse crescendo a taxas vigorosas, e estivesse ingressando na economia brasileira generosas somas de capital internacional para investimentos. Mas o cenário é o oposto, o mundo vive hoje o risco de uma grande recessão global. Dentre outras razões porque o mercado imobiliário dos EUA está atravessando uma bolha, como aconteceu em 2007. Há previsões que os preços das ações de empresas globais tenham perdas entre 30 e 40% neste ano.
     O mercado acionário brasileiro já teve um aperitivo do que pode suceder ao longo do ano: em fevereiro o Ibovespa apresentou perdas de 8,43% — maior queda desde maio de 2018 (-10,87%) e nesse momento, está passando por uma crise que não ocorria há anos. Este é um problema grave e muito concreto, que o governo brasileiro definitivamente não está preparado para enfrentar. Caracterizando o nível de incerteza que vigora nos mercados, o dólar vem batendo sucessivos recordes de valorização em relação ao real (hoje, 09.03, a cotação estava em R$ 4,75). Se advir uma crise financeira agora, nas proporções que os analistas estão estimando, vai pegar o Brasil completamente no contrapé.
     A fórmula aplicada por Paulo Guedes não funcionou em nenhum lugar do mundo (do ponto de vista dos interesses do país, evidentemente. Claro que funciona para os grandes capitalistas). Onde foi aplicada o crescimento estancou, o desemprego aumentou e o patrimônio público foi dilapidado. Este é o governo mais entreguista da história do Brasil, que não tem interesse e nem proposta para resolver nenhum grande problema nacional. Vender patrimônio nacional a preço de banana, verdadeiro crime de lesa pátria, e destruir as estruturas de atendimento ao povo pobre, é política de devastação nacional que só interessa aos países imperialistas, que promoveram o golpe no Brasil.  

                                                                                           *Economista. 09.03.20



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