quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Será que o Brasil aguenta esperar que o programa de Paulo Guedes dê errado?


                                                                             *José Álvaro de Lima Cardoso
     A estagnação econômica é muito prolongada. Após dois anos de uma das maiores recessões da história do Brasil (2015/2016), a economia está há três anos patinando em torno de 1% de crescimento. Não só não há recuperação à vista, como continua a destruição da economia, com muitas falências e uma piora dramática nas condições de emprego e renda dos trabalhadores. Algumas projeções são de que, mesmo que o PIB retorne ao patamar de antes da crise, em 2021, o produto per capita só voltará a esse nível em 2023. Esta não é uma crise capitalista comum, ela foi muito agravada por um golpe que, para se legitimar, devastou deliberadamente setores fundamentais da economia brasileira, como o de construção pesada e o de óleo e gás (após as denúncias do The Intercept alguém ainda pode duvidar disso?).
     Também pela razão acima a indústria vem encolhendo a cada mês, tendo sua produção caído 1,6% entre janeiro e junho deste ano, segundo o IBGE. A indústria está produzindo menos, mas nem assim consegue vender o pouco que produz. Tem aumentado a cada mês os chamados “estoques indesejados”, um eufemismo para uma produção que vem encalhando. A estagnação da indústria está diretamente relacionada à queda da demanda interna, decorrente do aumento do desemprego e da contração da renda.
     O mercado de trabalho, por sua vez, está num buraco sem fim. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNDA/IBGE), em junho último o número de desocupados estava em mais de 13 milhões. No período recente aumentou também o número de trabalhadores sem carteira e os por conta própria. Como se sabe, quando o desemprego está muito elevado, há um aumento simultâneo da informalização do trabalho. Ademais, há um aumento também do trabalho por “conta própria”. O mercado de trabalho brasileiro saiu, em março/2014, de pouco mais de 37 milhões de trabalhadores sem emprego e por conta própria, para mais de 42 milhões em junho/2019.
     O governo Bolsonaro, fruto de um processo de fraude eleitoral, não tem um plano factível para tirar a economia da estagnação. A conjugação de verbos feita pelo governo é sempre contra a maioria absoluta dos brasileiros: vender, entregar, destruir, liquidar. Paulo Guedes é um “fundamentalista”, que propaga fé cega nas “virtudes” do mercado capitalista. O conjunto de medidas de desestruturação do Estado brasileiro, especialmente a desmontagem drástica que sofrerá a Seguridade Social, através da PEC 6/2019 (sob tramitação no Senado Federal), neste quadro de aumento do desemprego e da precarização, já tornou a vida de uma parcela crescente da população trabalhadora, um verdadeiro inferno.
     Não há unidade em relação à permanência do Bolsonaro na presidência (especialmente com o rápido derretimento da (apenas) razoável base social que tinha no começo do governo). Mas o central, o que unifica as frações que perpetraram e sustentam o golpe de 2016, é o programa econômico, ou seja, a entrega do patrimônio nacional, destruição da indústria, liquidação da seguridade social, privatizações, etc. Para as forças que comandam o processo, tanto faz quem seja o presidente, desde que ajude a encaminhar esse programa econômico de guerra.
     Este é um projeto que dará errado, como aconteceu na Argentina e noutros países onde tentaram viabilizá-lo. Do ponto de vista da maioria da população, a fórmula neoliberal não funcionou em nenhum lugar do mundo onde foi implantada. Especialmente quando vem colada num entreguismo sem qualquer limite (e que é único no mundo). Claro, do ponto de vista do grande capital a fórmula pode funcionar, pelo menos durante um certo tempo. O aumento da exploração dos trabalhadores e a dilapidação do patrimônio público (vendido na bacia das almas), são oportunidades esplêndidas de lucratividade para o grande capital, numa economia mundial em grave crise. A população brasileira, registre-se, tem memória recente desse tipo de política, nos governos FHC (1995/2002). Naquele período, boa parte do patrimônio brasileiro foi dilapido, através da queima de estatais a preço de banana, e a vida dos trabalhadores piorou muito com queda da renda e elevação dramática da taxa de desemprego.
     O “programa” de governo de Guedes é vender o patrimônio do país e destruir as estruturas de atendimento à população, como está empenhado em fazer com a Seguridade Social. Acredita que destruindo essas estruturas, fruto de décadas de luta dos trabalhadores, o crescimento irá retomar. Se der errado, não há problema, culpa-se os sindicatos e o “populismo” do Congresso Nacional. Em face do aumento visível da pobreza e da escalada do desemprego, não sei se o Brasil suportará aguardar que o projeto de Paulo Guedes fracasse.  
                                                                                                                                 *Economista.
11.09

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