sexta-feira, 3 de agosto de 2018

A tarefa dos brasileiros é difícil, grandiosa e de longo prazo: recuperar e reconstruir o país


                                                                                    *José Álvaro de Lima Cardoso
     Segundo pesquisa da Voz Populi, divulgada recentemente, 69% dos brasileiros considera que sua vida piorou desde o Golpe de Estado de 2016. Apenas 6% dos entrevistados diz ter melhorado de vida. Na região Sul o número de insatisfeitos chega a 73%. A rejeição ao governo Temer passou de 73% há dois meses, para 83%. Se alguma coisa pode surpreender nos resultados da pesquisa é o fato da rejeição ao governo não ser ainda maior.       Afinal, o golpe, além de ter destruído direitos sociais em escala industrial, foi também um fracasso completo na condução da economia, afundando o país numa das mais graves crises da história. A crise é um fenômeno mundial, que acomete boa parte dos países do mundo. Porém, no Brasil os golpistas, além de terem agravado muito a crise, transferem todo o seu ônus para as costas dos trabalhadores, e mais pobres em geral, em benefício, principalmente, de interesses estrangeiros.
    Popularidade próxima de zero é um resultado inevitável (e suave) para um governo que está levando o país de volta para o mapa mundial da fome da ONU, por exemplo. Este resultado inacreditável é fruto de uma combinação de ações antinacionais e antipopulares. Estão cortando mais de R$ 10 bilhões dos programas Bolsa Família, aposentadoria por invalidez e auxílio-doença. A decisão afeta 5,7 milhões de pessoas: 5,2 milhões do Bolsa Família e 478 mil dos auxílios-doença e aposentadoria por invalidez. O governo pretende ainda cortar mais R$ 20 bilhões de gastos sociais, ação que atinge diretamente a população extremamente pobre, que caminha literalmente no limiar da fome. A combinação da retirada de milhões de pessoas do Bolsa Família, com a redução dos recursos investidos no Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), somados ao conjunto de atrocidades cometidas, tem como decorrência inevitável o desamparo de crianças, idosos e pobres em geral. Isso tudo em meio à maior crise econômica da história.
     Ao mesmo tempo em que economiza migalhas do orçamento (mas que são vitais para a sobrevivência dos pobres), o governo gastou mais de R$ 384 bilhões nos últimos 12 meses para pagar juros da dívida pública, valores que alimentam o apetite abutre de cerca de 10.000 famílias de super ricos. O orçamento do Bolsa Família, fundamental para quase 50 milhões de brasileiros, corresponde a cerca de 24 dias de pagamento da dívida pública, dívida essa que deveria ser imediatamente auditada, como determinou a Constituição de 1988. 
     Numa ponta, aumento da miséria e do sofrimento de boa parte da população; na outra, condenação do país a ser um eterno exportador de matérias-primas para o mundo desenvolvido. O orçamento de ciência e tecnologia que chegou a R$ 14 bilhões de reais em 2011, é neste ano de menos de R$ 4 bilhões. Isso em pleno desenvolvimento no mundo da quarta revolução industrial, quando o país precisaria multiplicar os investimentos em ciência e tecnologia para enfrentar os desafios colocados pelas novas tecnologias, nos campos do emprego e da competividade. Se esforçam, de maneira sórdida, para o Brasil voltar para o modelo primário exportador, o que revela a natureza antinacional as suas iniciativas.
     Sob a direção de economistas neoliberais, ou de entreguistas despudorados, o Brasil joga fora instrumentos públicos de intervenção estratégica, como as estatais, passando a depender exclusivamente de grandes multinacionais, que não têm nenhum compromisso com o país. O exemplo mais extremo é o da Petrobrás, que estão desmontando. Mas a política geral, é de desmonte de tudo que é público. O detalhe é que, no campo petrolífero, por exemplo, 92% das reservas de petróleo do mundo pertencem à empresas estatais.
     O desmonte é do Estado público, aquele que, com muitas limitações desempenha funções públicas nas áreas do crédito, da assistência social, da previdência, etc. A emenda constitucional 95, por exemplo, conhecida como emenda da morte, congelou gastos primários por 20 anos, para pagar mais juros da dívida, um tipo de medida que nem países rendidos pelo inimigo nas guerras, tomaram. O resultado dessa medida, aprovada em 2016, já estamos vendo com toda a crueza: após mais de uma década com quedas consecutivas, a taxa de mortalidade na infância (proporção de óbitos de menores de cinco anos para cada mil nascidos vivos) subiu 11% em 2016, em relação ao ano anterior, segundo dados do Ministério da Saúde e IBGE. Segundo os especialistas no tema, a elevação da taxa de mortalidade infantil está diretamente relacionada aos cortes feitos pelos golpistas em programas fundamentais como Rede Cegonha, Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) , Mais Médicos, o Bolsa Família, e a extinção, praticamente, do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
     Entrega da riqueza e da soberania e destruição de direitos, são faces da mesma moeda. De um lado, estão encaminhando o enfraquecimento do Estado nacional, entregando as riquezas nacionais, destruindo as políticas de soberania energética, desmontando a Petrobrás e entregando o pré-sal, negociando as reservas estratégicas de água para as multinacionais (incluindo o Aquífero Guarani) e reduzindo o orçamento em ciência e tecnologia; de outro lado, estão desmontando as políticas de segurança alimentar e aumentando a fome, causaram a maior crise econômica da história do país, afetaram drasticamente a renda dos trabalhadores, congelaram gastos primários (como educação e saúde) por 20 anos, destroem as empresas nacionais (inclusive do setor privado), liquidaram as leis de proteção ao trabalho, estão destruindo o que sobrou da indústria e condenando o Brasil a ser um eterno fornecedor de matérias primas para o mundo desenvolvido. Lutar contra tudo isso não é uma possibilidade, mas uma imposição da realidade e uma questão de sobrevivência.

                                                                                                       *Economista.

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