*José
Álvaro de Lima Cardoso
Segundo pesquisa da Voz Populi, divulgada
recentemente, 69% dos brasileiros considera que sua vida piorou desde o Golpe
de Estado de 2016. Apenas 6% dos entrevistados diz ter melhorado de vida. Na
região Sul o número de insatisfeitos chega a 73%. A rejeição ao governo Temer
passou de 73% há dois meses, para 83%. Se alguma coisa pode surpreender nos
resultados da pesquisa é o fato da rejeição ao governo não ser ainda maior. Afinal,
o golpe, além de ter destruído direitos sociais em escala industrial, foi também um fracasso completo na
condução da economia, afundando o país numa das mais graves crises da história.
A crise é um
fenômeno mundial, que acomete boa parte dos países do mundo. Porém, no Brasil
os golpistas, além de terem agravado muito a crise, transferem todo o seu ônus
para as costas dos trabalhadores, e mais pobres em geral, em benefício,
principalmente, de interesses estrangeiros.
Popularidade
próxima de zero é um resultado inevitável (e suave) para um governo que está
levando o país de volta para o mapa mundial da fome da ONU, por exemplo. Este
resultado inacreditável é fruto de uma combinação de ações antinacionais e
antipopulares. Estão cortando mais de R$ 10 bilhões dos programas Bolsa Família,
aposentadoria por invalidez e auxílio-doença. A decisão afeta 5,7 milhões de
pessoas: 5,2 milhões do Bolsa Família e 478 mil dos auxílios-doença e
aposentadoria por invalidez. O governo pretende ainda cortar mais R$ 20 bilhões
de gastos sociais, ação que atinge diretamente a população extremamente pobre,
que caminha literalmente no limiar da fome. A
combinação da retirada de milhões de pessoas do Bolsa Família, com a redução
dos recursos investidos no Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura
Familiar (PAA), somados ao conjunto de atrocidades cometidas, tem como
decorrência inevitável o desamparo de crianças, idosos e pobres em geral. Isso
tudo em meio à maior crise econômica da história.
Ao mesmo tempo em que
economiza migalhas do orçamento (mas que são vitais para a sobrevivência dos
pobres), o governo gastou mais de R$ 384 bilhões nos últimos 12 meses para
pagar juros da dívida pública, valores que alimentam o apetite abutre de cerca
de 10.000 famílias de super ricos. O orçamento do Bolsa Família, fundamental
para quase 50 milhões de brasileiros, corresponde a cerca de 24 dias de
pagamento da dívida pública, dívida essa que deveria ser imediatamente
auditada, como determinou a Constituição de 1988.
Numa
ponta, aumento da miséria e do sofrimento de boa parte da população; na outra,
condenação do país a ser um eterno exportador de matérias-primas para o mundo
desenvolvido. O orçamento de ciência e tecnologia que chegou a R$ 14 bilhões de
reais em 2011, é neste ano de menos de R$ 4 bilhões. Isso em pleno
desenvolvimento no mundo da quarta revolução industrial, quando o país
precisaria multiplicar os investimentos em ciência e tecnologia para enfrentar
os desafios colocados pelas novas tecnologias, nos campos do emprego e da
competividade. Se esforçam, de maneira sórdida, para o Brasil voltar para o
modelo primário exportador, o que revela a natureza antinacional as suas
iniciativas.
Sob a direção de economistas neoliberais,
ou de entreguistas despudorados, o Brasil joga fora instrumentos públicos de
intervenção estratégica, como as estatais, passando a depender exclusivamente
de grandes multinacionais, que não têm nenhum compromisso com o país. O exemplo
mais extremo é o da Petrobrás, que estão desmontando. Mas a política geral, é de
desmonte de tudo que é público. O detalhe é que, no campo petrolífero, por
exemplo, 92% das reservas de petróleo do mundo pertencem à empresas estatais.
O desmonte é do Estado público, aquele que,
com muitas limitações desempenha funções públicas nas áreas do crédito, da
assistência social, da previdência, etc. A emenda constitucional 95, por
exemplo, conhecida como emenda da morte, congelou gastos primários por 20 anos,
para pagar mais juros da dívida, um tipo de medida que nem países rendidos pelo
inimigo nas guerras, tomaram. O resultado dessa medida, aprovada em 2016, já
estamos vendo com toda a crueza: após mais de uma década com quedas
consecutivas, a taxa de mortalidade na infância
(proporção de óbitos de menores de cinco anos para cada mil nascidos vivos)
subiu 11% em 2016, em relação ao ano anterior, segundo dados do Ministério da Saúde e
IBGE. Segundo os especialistas no tema, a elevação da taxa de mortalidade
infantil está diretamente relacionada aos cortes feitos pelos golpistas em programas
fundamentais como Rede Cegonha, Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) ,
Mais Médicos, o Bolsa Família, e a extinção, praticamente, do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
Entrega da riqueza e da soberania e
destruição de direitos, são faces da mesma moeda. De um lado, estão
encaminhando o enfraquecimento do Estado nacional, entregando as riquezas
nacionais, destruindo as políticas de soberania energética, desmontando a
Petrobrás e entregando o pré-sal, negociando as reservas estratégicas de água
para as multinacionais (incluindo o Aquífero Guarani) e reduzindo o orçamento
em ciência e tecnologia; de outro lado, estão desmontando as políticas de
segurança alimentar e aumentando a fome, causaram a maior crise econômica da
história do país, afetaram drasticamente a renda dos trabalhadores, congelaram
gastos primários (como educação e saúde) por 20 anos, destroem as empresas
nacionais (inclusive do setor privado), liquidaram as leis de proteção ao
trabalho, estão destruindo o que sobrou da indústria e condenando o Brasil a
ser um eterno fornecedor de matérias primas para o mundo desenvolvido. Lutar
contra tudo isso não é uma possibilidade, mas uma imposição da realidade e uma
questão de sobrevivência.
*Economista.
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