*José Álvaro de Lima Cardoso
Recentemente o ministro da economia, Paulo
Guedes, falou que o Brasil teria que vender rapidamente a Petrobrás, porque
daqui a 30 anos ela não valerá mais nada. Como já observamos em outro texto, ele
deveria alertar do problema os “desinformados e ingênuos” banqueiros (tendo à
cabeça os EUA) que deram um golpe arriscadíssimo, e de graves consequências no
Brasil, com o objetivo econômico principal de roubar o petróleo e outras
riquezas fundamentais. Cabe saber que governo, em sã consciência, ou que não
fosse resultado de um processo sórdido, entregaria a preço de banana, um
patrimônio que gerou R$ 74 bilhões de lucro líquido apenas nos 2º e 3º
trimestres de 2021 e que neste ano fará a maior distribuição de dividendos para
os seus acionistas na história da empresa.
Muita gente
questiona como os “capitalistas nacionais” apoiaram o golpe de 2016 e a entrega
da Petrobrás para o sistema financeiro internacional. Afinal de contas a Companhia
é fundamental para as empresas nacionais do ponto de vista da tecnologia,
fornecimento de matérias primas, atração de investimentos e garantia de energia
barata (sem a qual não há desenvolvimento). Mas, aqui é necessário compreender
que alguns setores da burguesia brasileira são estreitamente associados à
burguesia norte-americana, especialmente ao capital financeiro internacional.
Eles estão longe de serem capitalistas nacionais, com interesses próprios, distintos
do imperialismo. Por isso atuam sempre em consonância com os interesses
imperialistas. Esse processo ficou muito evidente em 2016, quando setores do
empresariado, que se beneficiaram diretamente com as políticas de crescimento e
de aumento do mercado consumidor interno promovidas pelos governos de esquerda,
aderiram à galope ao processo golpista que vinha sendo engendrado, com a mal
dissimulada coordenação dos Estados Unidos.
Bolsonaro
é fruto direto do golpe de 2016 e da fraude eleitoral de 2018. Para o
imperialismo (e portanto para a burguesia brasileira), ele é um excelente
presidente, porque está cumprindo todo o programa de guerra contra a população.
Como disse o banqueiro André Esteves, do BTG, no vídeo vazado há uns dias: “se
Bolsonaro fechar a boca ele tem grandes chances de vencer as eleições”. Claro,
porque caso não surja uma terceira via ele será o candidato da burguesia. Afinal,
ele tem uma “ótima política” de liquidação de direitos, com a vantagem de propor
recorrentemente em privatizar a Petrobrás (claro, sempre como se fossem falas
casuais).
Neste
debate da Petrobrás e da questão nacional, é fundamental compreender que o
capital imperialista não se impõe num país predominantemente por meios
econômicos. Não é que as empresas multinacionais seriam extremamente eficientes,
muito produtivas, e, por mecanismos de mercado, engoliriam as empresas nacionais.
Esse fator acontece também, mas está longe de ser predominante, além de ser precedido
de mecanismos extra-mercado. O imperialismo atua predominantemente através de
meios extra econômicos, ou seja, atua através da sua força política, econômica
e bélica. É desta forma que consegue manter sob controle, em grande medida, a
economia dos países em que atua.
O golpe
de Estado no Brasil (como no subcontinente latinoamericano) é prova cabal disso.
O imperialismo, disposto a interromper o crescimento da esquerda no país (mesmo
sendo esta muito moderada e negociadora) mobilizou, possivelmente, bilhões de
dólares para corromper dirigentes, obter informações, comprar meios de
comunicação, pagar espiões, para dar o golpe. Pensem no custo financeiro,
logístico e político de uma operação dessas. Mas técnicas de guerra híbrida,
recrutamento dos traidores internos, compra de autoridades, são ações que nada
têm a ver com disputa econômica via concorrência, no sentido clássico da
expressão.
Vamos
recordar aqui uma medida diretamente decorrente do golpe, a Medida Provisória
795, mais conhecida como “MP da Shell”, aprovada no final de novembro de 2017,
que criou um regime especial de importação de bens a serem usados na
exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros
hidrocarbonetos, com benefícios fiscais para multinacionais petroleiras. Só
essa medida irá representar, em 20 anos, perda de receita para o Brasil na casa
de R$ 1 trilhão. Por mais ingênuo que se seja, é possível alguém acreditar que
uma medida desse tipo seja boa para o Brasil e que tenha sido encaminhada de
boa-fé? Claro que processo proporcionou muito dinheiro para grupos internos que
puderam influenciar os resultados. Essa medida nada tem a ver com concorrência
econômica, o golpe de Estado num país complexo como o Brasil não tem nada a ver
com concorrência. É uma ação de autoria do imperialismo para continuar dominando
uma parte fundamental do planeta: território, mercado consumidor, apoio
político, bases militares. Um processo sofisticado como esse passa
necessariamente por corrupção. Ou as raposas políticas brasileiras ignoram que
estão destruindo o Brasil em benefício do país mais imperialista da terra e do
imperialismo de conjunto?
Muita
gente pensa que Bolsonaro é um idiota absoluto, mas quando ele fala em
privatizar a Petrobrás, o faz de caso pensado. É para agradar os seus senhores e
também experimentar como a população reage. Se não houver sinais de reação ao
risco de privatizar a Petrobrás eles irão fazer. O capital internacional usa
seu dinheiro e influência para definir os rumos, ou seja, dominar a política
nacional. É assim que funciona o capital imperialista. Não é que ele domine a
situação porque sua tecnologia e eficiência sejam superiores, ou porque dispõe
da melhor tecnologia e grande capacidade de gestão de empresas. A predominância
do imperialismo é um fenômeno essencialmente político e militar. Para preservar
seu poderio, se precisar eles destroem um país, como já fizeram com
vários.
Os
Estados Unidos pressionaram o Brasil para banir a chinesa Huawei do processo de
implantação do 5G no Brasil. Recentemente, em agosto, veio uma delegação
americana que se reuniu com Bolsonaro e também com representantes da Agência
Nacional de Telecomunicações (Anatel), responsável pelo leilão da tecnologia, e
também com empresas envolvidas no desenvolvimento das futuras redes de
telecomunicações. Quando o governo norte-americano vem ao Brasil e discute com
o bolsonaro que o governo deve rejeitar a tecnologia chinesa no 5G, essa é uma
ação que nada tem a ver com concorrência econômica. Trata-se da maior potência
béclica da terra, pressionando um governo servil e advindo de um golpe, em
benefício de suas empresas nacionais. Essa é a “concorrência” vigente na etapa
atual de desenvolvimento do sistema capitalista.
*Economista,
10.11.21