*José Álvaro de Lima Cardoso
Completados dois anos do
golpe, dentre os inúmeros recuos sociais decorrentes, chama especial atenção o processo
de desmonte do Estado:
a) estão privatizando empresas fundamentais, a intenção é vender o que for possível e rapidamente: Sistema
Eletrobrás, Correios, Banco do Brasil, CEF. Se a correlação de forças permitir
e conseguirem institucionalizar o golpe através das eleições, a Petrobrás
também será privatizada;
b) estão
esvaziando o Sistema Único de Saúde, SUS. Querem construir um “novo sistema de
saúde”, transferindo recursos do SUS para financiar a alta complexidade nos
planos privados de saúde;
c) acabaram
com as limitações da terceirização à atividades-meio, decisão ratificada pelo Supremo Tribunal Federal no dia 30 de
agosto, que votou pela constitucionalidade da terceirização da contratação de
trabalhadores para a atividade-fim das empresas. O que deve afetar, no curto ou
médio prazos, as próprias contratações na administração pública;
d) estão
liquidando os programas sociais. Há pouco tempo cortaram mais de R$ 10
bilhões dos programas Bolsa Família, aposentadoria por invalidez e
auxílio-doença. E enunciam novos cortes;
e) congelaram gastos primários por 20 anos,
para pagar mais juros da dívida (EC 95, Emenda da Morte), uma medida que nem um
país rendido pelo inimigo adotaria.
O resultado de todas essas medidas, visto no conjunto, tem sido fenômenos
como o aumento de casos de mortalidade infantil, a partir de 2016, o que não
ocorria há 15 anos, e o retorno de doenças que já tinham sido erradicadas no
Brasil há séculos. Há, portanto, um processo de desmonte do Estado. Mas estão
desmontando o Estado público, que, mesmo com muitas limitações presta serviços
fundamentais ao país e ao povo. Aquele que desempenha
funções nas áreas do crédito, da assistência social, da previdência, e que é que
é fruto da luta política dos trabalhadores.
O desmonte do Estado público significa, ao
mesmo tempo, o fortalecimento do Estado que está à serviço do setor privado, e que
os capitalistas sempre defenderam sem cerimônia. Por exemplo, ainda em 2017, o
governo concedeu um perdão da dívida de impostos ao banco Itaú, na casa dos R$ 25
bilhões, valor próximo ao orçamento do Bolsa Família, que retira quase 50
milhões de brasileiros da fome. Ainda que o Estado tenha o monopólio da
fabricação de Dinheiro, este não nasce em árvores. Portanto, subsidiar os ricos
significa tirar dos pobres. É isso que vem ocorrendo. Em 2013 o programa Bolsa Família beneficiou cerca de
14 milhões de famílias — o que equivale a aproximadamente um quarto da
população do país. Em 2016 e 2017 os golpistas fizeram grandes reduções no
número de famílias assistidas, e em julho de 2017 tinha 1,5 milhão de pessoas a
menos recebendo o benefício em relação a julho de 2014.
Um outro exemplo impressionante. Para o
aumento salarial de 16,38% dos juízes, o governo ilegítimo de Temer irá cortar
mais de R$ 1,1 bilhão dos investimentos previstos para 2019. Para aumentar
salários de juízes que são os mais caros do mundo (com o aumento, o teto
salarial dos juízes irá para R$ 39 mil), o governo irá fazer uma emenda no
orçamento de 2019, apontando que os recursos sairão de investimentos públicos. Somente
o auxílio moradia dos juízes, de R$ 4.377,73, é superior ao salário de 92% da
população brasileira. O detalhe nada trivial é que um
ano do gasto com salário de juízes no Brasil equivale a todo o investimento que
o país faz em Ciência e Tecnologia num período de quatro anos, com base no
orçamento de 2017. Em 2017, o Brasil
gastou 1,26% com salários de juízes no orçamento. Para termos uma ideia do que
isso representa, toda a estrutura para manter o Ministério de Ciência e
Tecnologia e mais os investimentos da pasta no desenvolvimento tecnológico do
país ficaram em 0,29% do orçamento executado em 2017. Em outras palavras, com
salários de juízes, gastou-se mais do que com todo o orçamento de Ciência e
Tecnologia, que aliás, vem caindo a cada ano. É de fato o fim da picada. No ano passado, no país onde o salário médio
é de R$ 2.154,00, cada juiz do Brasil recebeu, em média, mais de R$ 500 mil.
Há uma relação direta entre os cortes drásticos
dos programas sociais e as elevações da pobreza, desemprego e desigualdade no
Brasil como um todo. No ano passado, a pobreza extrema (para o Banco Mundial,
pessoas que vivem com 1,9 dólar por dia), aumentou pelo terceiro ano
consecutivo, em 11%, o que representa o número impressionante de 14,8 milhões
de compatriotas. O aumento da pobreza pode, inclusive, ser feito diretamente,
sem o auxílio de pesquisa, pela simples observação do impressionante aumento do
número de moradores de rua nos centros da maioria das cidades brasileiras.
*Economista (02.08.2018).
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