*José Álvaro de Lima Cardoso
Estamos no sétimo ano seguido
de estagnação ou recessão na economia e, a partir de 2016, explodiu a pobreza
no país. Isso é fruto direto do golpe, portanto dos efeitos da operação Lava
Jato. A Lava Jato foi uma engrenagem fundamental tanto para o impeachment em 2016,
quanto para a fraude eleitoral de 2018, dois momentos chaves do golpe. A Lava Jato
era propagandeada como a maior operação anticorrupção do mundo, mas ela mesma
se revelou um crime de grandes proporções. O caso Watergate (1973), que
derrubou o presidente Richard Nixon nos EUA, pode ser considerado discreto, quando
comparado com a Lava Jato. Principalmente em termos de impacto na sociedade e
na economia. Os envolvidos na Lava Jato praticamente destruíram um país para
retirar uma força política do poder, a serviço da maior e mais beligerante
potência estrangeira.
Num dos vazamentos das
conversas entre os integrantes da operação, ocorridos mais recentemente, o
chefe da operação, Deltan Dallagnol, pronuncia uma frase muito emblemática,
praticamente uma síntese da Lava Jato. Em abril de 2018, quando os procuradores
souberam do mandato de prisão do ex presidente Lula, Dallagnol comemorou,
dizendo: "é um presente da CIA”.
A partir da Vaza Jato, em
2019, ficou evidente, fácil de entender, porque não queriam tornar públicos os
arquivos da Operação: são confissões de autênticos criminosos. Quando surgiram
as denúncias da Vaza Jato, em 2019, num determinado momento, enquanto o país
aguardava mais um capítulo da série “The Intercept Brasil – As Mensagens
Secretas da Lava Jato”, Sérgio Moro viajou para os Estados
Unidos, como Ministro da Justiça e Segurança Pública, sem previsão na
agenda, para “fazer visitas técnicas a
instituições”. Claro, pego completamente com a boca na botija, foi ouvir
orientações dos seus mentores e chefes nos EUA.
Os prejuízos da Lava Jato no
campo da democracia e do Estado Democrático de Direito são incalculáveis. É
ilusão achar que a gente ainda vive a democracia “meia boca”, que vigorava
antes do golpe. Nem isso existe mais. Lógico, se colocam o presidente mais
importante da história do país, na cadeia, sem nenhuma prova, imaginem o que
podem fazer com qualquer um de nós?
Mas não foi só a frágil democracia
que foi esfacelada. Conforme estudo recente do DIEESE (IMPLICAÇÕES
ECONÔMICAS INTERSETORIAIS DA OPERAÇÃO LAVA JATO) a Operação estadunidense
quebrou também a economia brasileira. O estudo mostra que por conta da farsa
montada com a Lava Jato, R$ 172,2 bilhões deixaram de ser investidos no País,
soma equivalente a 40 vezes os R$ 4,3 bilhões que a Lava
Jato informa afirma ter recuperado para os cofres públicos. A Lava Jato, que
visava atingir a maior empresa do Brasil e da América Latina, levou a uma crise
inusitada no setor de petróleo e gás, e a uma queda drástica da taxa de
investimentos. Os estadunidenses quando perceberam que podiam quebrar, além da
Petrobrás, o entorno da empresa, não tiveram dúvidas. Petróleo e gás, e
construção civil concorrem diretamente com as empresas norte-americanas. Mais
tarde fizeram a operação “carne fraca” para pegar a indústria da alimentação.
A partir do segundo semestre
de 2014, há quase seis anos, quando começou a pancadaria para cima da
Petrobrás, o Escritório Regional do DIEESE em Santa Catarina, realizou uns 12
ou mais seminários nas mesorregiões catarinenses (são seis), para discutir
Petrobrás, Lava Jato e o golpe. Se chamavam:
“Conjuntura econômica nacional: Petrobrás no olho do furacão”. Era uma batalha de David contra Golias:
fazíamos um seminário de tarde toda, com 50 ou 60 pessoas; no mesmo dia à noite
a Rede Globo destruía a Petrobrás em 20 minutos de matéria, para cerca de 100
milhões de pessoas. Usando os recursos mais sofisticados de comunicação.
Nos seminários (realizados
principalmente no primeiro semestre de 2015) os dados que divulgávamos, da
empresa, eram do seguinte tipo:
● A Petrobrás ultrapassou, em 2014, a norte-americana, EXXON
MOBBIL, como a maior produtora de petróleo do mundo, entre as companhias
petrolíferas de capital aberto
●O EBITDA (potencial de geração de caixa de uma empresa) do 1S-2015 foi
de R$ 41,2 bilhões, 35% superior em relação ao 1S-2014
● Empresa Investe mais de 100 bilhões de reais por ano
● Paga mais de R$ 72 bilhões em impostos para o Brasil
●Opera uma frota de 326 navios, tem 35.000 quilômetros de dutos, mais de
17 bilhões de barris em reservas, 15 refinarias e 134 plataformas de produção
de gás e de petróleo
● Aumento de 80% na produção do pré-sal no último ano
● Responde por mais de 10% de todo o investimento brasileiro em 2014
● Tem o maior plano de investimentos em curso no século XXI, feito por
uma única corporação: cerca de U$ 200 bilhões de dólares seriam aplicados em
exploração e produção entre 2015 e 2019 (um trilhão de reais ao câmbio atual).
● Opera o maior número de plataformas flutuantes de produção do mundo:
110 unidades de produção na costa marítima brasileira (offshore), 45
flutuantes; quatro plataformas do tipo FSO, que apenas armazenam e transferem
petróleo
● A participação do setor de Óleo e Gás no PIB do País, que era de apenas
2% em 2000, em 2015 é de 13%
Com esses seminários, nossa tentava
era a de explicar que a operação Lava Jato tinha sido desencadeada por causa
destes números e não porque a Petrobrás estivesse quebrada. Mas estava (está)
em curso uma guerra híbrida, de força avassaladora, de mentiras e
contrainformações, visando tornar a empresa insignificante no jogo
internacional do petróleo. E que conta com muitos aliados dentro do Brasil.
A avaliação que estava por
detrás da realização daqueles seminários era a que de a Petrobrás seria o nosso
passaporte para o desenvolvimento. Com a descoberta do pré-sal, e com a Lei de
Partilha, votada em 2010, a empresa se tornou uma zeladora constitucional e
natural, da maior riqueza natural que o povo brasileiro dispõe neste momento,
que é o petróleo e o gás, para se construir um projeto de desenvolvimento
nacional.
Infelizmente, 100% das nossas
conclusões nesses seminários estavam corretas. Alguns diziam que a gente estava
se dobrando à “teoria da conspiração”. Como se não existisse conspiração no
mundo, ou como se os EUA nunca tivessem dado golpes em nenhum país, e fizessem
tudo às claras e com as melhores intenções.
Tem um aspecto que é central em toda a operação Lava Jato: a estratégia
dos EUA para a América Latina é impedir o surgimento de potências regionais,
especialmente em áreas com abundância de recursos naturais, como é o caso do
Brasil. O modelo dos norte-americanos, proposto para a região é o de países com
Forças Armadas limitadas, incapazes de defender suas riquezas naturais,
especialmente o petróleo.
A partir do anúncio do pré-sal
pelo Brasil, em 2006, os EUA reativaram a 4ª Frota Naval, dedicada a policiar o
Atlântico Sul e rejeitaram a resolução da ONU que garantia o direito brasileiro
às 200 milhas continentais. A proposta dos americanos, e dos entreguistas, sempre
foi tirar a Petrobrás do caminho e possibilitar às multinacionais do petróleo a
apropriação dos bilionários recursos existentes no pré-sal que, no limite,
podem chegar a quantidades próximas à Venezuela e Arábia Saudita. Quando a
Petrobrás anunciou o pré-sal, os críticos, bafejados pelas multinacionais do
petróleo, diziam que o petróleo naquelas profundidades não teria viabilidade
comercial. Chegaria tão caro na superfície, em função do custo de extração, que
não teria viabilidade comercial. Hoje os custos de extração do barril do
petróleo, do pré-sal, estão a US$ 5, praticamente o custo da Arábia Saudita,
que retira petróleo praticamente à flor da terra.
Muitos observadores não querem
dizer o óbvio, por medo (porque se trata dos EUA, o país mais poderoso da
Terra), ou senso de autopreservação. Mas o que se sabe é que os Estados Unidos
para continuar na condição de potência, depende crescentemente dos recursos
naturais da América Latina e, por esta razão, não quer perder o controle
político e econômico da Região. Uma das lições do golpe no Brasil é que se a
gente quiser ter um país soberano tem que construir as condições geopolíticas e
militares para isso. Especialmente quando se trata de um produto para o qual
não existe substituto no curto prazo (por mais que isso soe desagradável).
A Petrobrás foi o alvo central
da operação, porque se trata de petróleo: produto fundamental e maior causador
de todos os conflitos bélicos nos últimos 100 ou 150 anos e sem substituto no
curto prazo, como fonte de energia e matéria-prima da indústria. Além disso,
como já falaram alguns economistas, a Petrobrás não é uma empresa e sim uma
nação amiga: é a maior companhia da América Latina, produzia, em 2013, 2,6
milhões de barris de petróleo diários, tinha uma força de trabalho de mais de
100 mil trabalhadores, operava em 25 países, tinha um lucro de R$ 23,6 bilhões
e era a 13ª maior companhia de petróleo do mundo no ranking da revista Forbes.
Economista. 22.03.2021.
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