*José Álvaro de Lima Cardoso
Segundo a Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), divulgada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no último dia de janeiro, 41,1% da
força de trabalho, 38,4 milhões de pessoas, se encontra na informalidade. O
informais são os trabalhadores sem carteira assinada (incluindo trabalhadores
domésticos), empregadores sem CNPJ, pessoas que atuam por conta própria sem
CNPJ e ainda os trabalhadores familiares auxiliares (estes, sem remuneração).
A taxa média de desocupação
ficou em 11,9% no ano passado, o que representa 12,6 milhões de pessoas
desocupadas no país. Para efeito de comparação, em 2014, ocasião em que este
indicador estava no ponto mais baixo da série histórica, haviam 6,8 milhões de
desempregados. Segundo o IBGE, das 1,8 milhão de vagas criadas, 446 mil foram de
trabalhadores sem carteira assinada e 958 mil são de ocupações de trabalhadores
por conta própria (dentre os quais 586 mil não têm CNPJ). A população
subutilizada na força de trabalho (trabalhadores desocupados e subocupados por
insuficiência de horas trabalhadas) atingiu o maior número da série histórica
da PNAD, 27,6 milhões de pessoas em 2019.
O número de trabalhadores por
conta própria também foi o maior nível da série, alcançando 24,2 milhões. Dentre
os por conta própria, quase 19,3 milhões não tem registro formal. É evidente
que estes trabalhadores se tornaram conta própria não por opção, mas pela
disparada da taxa de desemprego nos últimos anos, assim como pela sub ocupação
da força de trabalho. Segundo o IBGE, o número de subocupados, ou seja, os
desocupados e os que não conseguem trabalhar um mínimo de horas semanais, está
quase 80% acima do indicador verificado em 2014, ocasião em que foi registrado
o menor número da série histórica (15,4 milhões).
No fundo a política do golpe
a partir de 2016 foi desenvolvida exatamente para esse tipo de resultado. Em
2014, ano que a taxa de desemprego atingiu o menor percentual da série
histórica, se ouvia nas mesas de negociações salarial, de que não havia
mão-de-obra disponível, que estava impossível contratar trabalhadores. Tivemos
assim, uma experiência prática da importância, para os capitalistas, de dispor
do chamado exército industrial de reserva, para fazer o trabalhador baixar a
cabeça e desarmar a organização sindical. O golpe foi desfechado para desmontar
direitos seculares e entregar as riquezas naturais e estatais estratégicas. Talvez
nem mesmo os brasileiros mais ingênuos, que saíram às ruas vestidos de pato,
acreditam que, se destruir a previdência, desmontar os sindicatos e vender
todas as estatais, o emprego retornará. Após dois anos da mais grave recessão
da história do Brasil (2015 e 2016), a economia patina em torno de 1% de
crescimento, o que fez piorar muito todos os indicadores do mercado de trabalho.
Não é fácil as pessoas
entenderem, mas esta não é uma crise “comum”, ligada aos ciclos capitalistas,
de crescimento, estabilização e queda, como sucedia até a década de 1970. A
magnitude da crise brasileira é decorrência de um processo golpista, coordenado
pelos EUA, com caráter subcontinental, e que devastou deliberadamente setores
fundamentais da economia brasileira, como o de construção pesada e o de óleo e
gás. O centro da política governamental, completamente contra os
interesses da maioria, é o desmonte de políticas sociais, destruição de
direitos e entrega das riquezas. Cálculos do jornal EL PAÍS, com base em dados
públicos, avaliam que 1,7 milhão de famílias, equivalente a cerca de 5 milhões
de pessoas, estão na fila de espera do Bolsa Família, apesar de preencherem
todos os critérios para receber o benefício. Isso para um benefício concedido a
pessoas que estão passando fome. Ou seja, a política de Bolsonaro/Guedes não é
apenas ineficaz do ponto de vista do crescimento, mas é de uma crueldade inominável.
Alguns economistas do “mercado”
estão dizendo que para o Brasil crescer, em face da crise mundial, terá que realizar
“reformas mais profundas”. Paulo Guedes, cuja concepção econômica reporta 40
anos atrás, quando o neoliberalismo não havia sido experimentado em larga
escala na América Latina, pretende privatizar todas as estatais. Paulo Guedes é
um aprendiz de feiticeiro, que amanhã ou depois talvez nem resida mais no
Brasil. Mas a política econômica que está colocando em prática, é o todo tempo blindada
porque é extremamente funcional aos interesses de quem coordenou o golpe de
Estado. Colocaram definitivamente a política econômica do Brasil à serviço dos
interesses externos, especialmente norte-americanos. Ele e Bolsonaro serão
mantidos lá enquanto estiverem cumprindo esse papel fundamental, até porque,
para eles, as alternativas de substituição são “escassas”.
O Brasil prepara-se para sair
do ranking dos 10 maiores países industriais do mundo. Para tratarmos de um
período mais recente, desde 2014, a atividade nas fábricas brasileiras vem
recuando ano a ano. Decorrência direta de um processo mais profundo de
desindustrialização, mas que foi acelerado pelas políticas do golpe. No ano
passado, a indústria, que já representava apenas cerca de 11% do Produto
Interno Bruto (PIB), possivelmente sofreu novo recuo. Ao mesmo tempo, o
Santander divulga lucro em 2019 de R$ 14,5 bilhões, um aumento de 17% em
relação ao obtido no ano anterior. Em um ano em que a economia cresce 1% e a
indústria recua, o banco aumentou o lucro em 17% e inaugura 45 novas agências. Enquanto isso, os bancos públicos são rapidamente
desmontados. O Banco do Brasil, fechou 463 agências e diminuiu o número de
funcionários em 3.360, entre setembro de 2018 e setembro de 2019. No mesmo
período, a Caixa Econômica fechou 46 agências e reduziu o número de empregados
em 1341.
Os representantes dos grandes
capitalistas e do capital financeiro, fazem algumas críticas pontuais ao
governo Bolsonaro (normalmente ligadas ao campo dos costumes), ao mesmo tempo
em que apoiam a política econômica, como se esta fosse de interesse do pais.
Esse 1% mais rico da população apoiam a política econômica com inteira razão. Eles
não têm o que reclamar do governo.
*Economista 03.02.20.
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