Transcrito do Jornal GGN
O entendimento pleno entre Michel
Temer e os ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes, a respeito da farta
percepção de golpe, não surpreende, por nenhum dos três. Mas a adesão
de Celso de Mello a manifestações públicas de fundo político, sem razão
alguma para sair de sua área, é mais uma contribuição para a difundida
inconformidade com o Supremo na atual crise.
Causa mais citada pela inconformidade,
a protelada apreciação do afastamento de Eduardo Cunha da presidência
da Câmara –pedido há quatro meses pelo procurador-geral Rodrigo Janot–
recebeu afinal uma explicação, embora indireta, do ministro Teori
Zavascki. Em síntese, a acusação principal no pedido são os trambiques
de Eduardo Cunha contra a ação do Conselho de Ética que o ameaça. No
entender de Zavascki e outros, porém, o tema compete à Câmara.
O problema se repete: com o êxito dos
pulos de Cunha e o alheamento do Supremo, nada resta a fazer contra o
comando da Câmara por um réu em processo no próprio Supremo. E no
tribunal os ministros citados e ainda outros, como Dias Toffoli e Cármen
Lúcia, dizem que "as instituições e a democracia estão funcionando".
Celso de Mello considera "um
gravíssimo equívoco" as referências de Dilma a golpe. Porque "o
procedimento destinado a apurar a responsabilidade da senhora presidente
da República respeitou todas as fórmulas estabelecidas na
Constituição".
As fórmulas. Ou seja, Celso de Mello
considera a forma, e se satisfaz. Mas o golpe não está na forma, está na
essência, no argumento, que apenas se vale da forma. E este argumento
consiste em, de repente, considerar crime, para efetivar um impeachment,
uma prática financeira aceita nos governos anteriores e em atuais
governos de Estados. Um casuísmo, portanto, um expediente oportunista.
Integrante mais antigo do Supremo,
nomeado ainda por Sarney, Celso de Mello é o ministro que mais recorre a
bases teóricas do Direito, em imensas digressões engordadas com
citações a autores, jurisprudências e votos passados. O seu súbito
enlace com o formalismo, e do mais simplório, pode satisfazer-lhe a
visão política, mas trai sua dificuldade de sustentar com argumentos
jurídicos o golpe da repentina criminalização de créditos suplementares,
velhos conhecidos da Fazenda, do Tesouro e do TCU.
Dias Toffoli também tem o que dizer
sobre o que os jornais disseram que Dilma diria na ONU mas não disse, e
por isso os que inventaram que ela diria agora se dizem surpresos.
Toffoli: "Alegar que há um golpe em andamento é uma ofensa às
instituições brasileiras. E isso pode ter reflexos ruins no exterior".
Os reflexos ruins já estão na imprensa internacional, que não se deixou
enganar. Sem falar no manifesto de 8.000 juristas mundo afora,
denunciando o golpe.
"Ofensa às instituições" é a trama em
montagem para separar o processo, no TSE presidido por Toffoli, sobre as
contas de campanha da chapa Dilma-Temer. Com um processo para cada um,
como Gilmar Mendes articula, Temer pode ser absolvido enquanto Dilma é
condenada. Gilmar Mendes chegou a dizer que "o tribunal (Superior
Eleitoral) tinha posição contrária, mas agora podemos ter um quadro
novo". Outro casuísmo, outro expediente oportunista. O golpinho filhote
do golpe.
Em importante artigo na "Ilustríssima"
de domingo (17) (pág. 6), cuja leitura recomendo muito, Daniel Vargas
faz uma análise original e aguda do Judiciário e, em particular, do STF.
Constitucionalista, doutor em Direito Público por Harvard, em dado
exemplo diz: "Cármen Lúcia e Dias Toffoli, ao afirmarem publicamente que
impeachment não é golpe, pois está previsto na Constituição, abusam da
retórica para, implicitamente, oferecer suporte ao movimento político de
destituição da presidente Dilma Rousseff".
É o que fazem também os outros
ministros aqui citados, com exceção de Teori Zavascki, que mantém a
reserva devida por magistrados. São 35 os partidos com registro. Mais os
meios de comunicação. O Supremo Tribunal Federal não precisa ser mais
do que Supremo Tribunal Federal. Aliás, precisa-se que seja o Supremo
Tribunal Federal.
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