terça-feira, 5 de novembro de 2019

A “fúria moderna” na luta pelo petróleo


                                                                                                      *José Álvaro de Lima Cardoso
“A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se a dos grupos nacionais... (Eu) quis criar a liberdade nacional na potencialização de nossas riquezas através da Petrobras, e mal começou a funcionar, a onda de agitação se avoluma.... Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente” (trechos da carta testamento de Getúlio Vargas, de 1954).
     No dia 06.11 a Petrobrás irá realizar o leilão do Excedente de Cessão Onerosa, no qual está prevista a venda de 15 bilhões de barris de petróleo. No dia seguinte, 07/11, irá ocorrer a 6ª Rodada de Licitação do pré-Sal, no qual será realizada a venda de 42 bilhões de barris de petróleo. Conforme definiu a FUP (Federação Única dos Petroleiros), é “o maior saqueio da história do país”. A chamada cessão onerosa é um regime especial de exploração e produção de petróleo e gás, no Brasil implantado em 2010 por meio de um acordo com a União. Através da cessão onerosa a União cedeu o direito da Petrobrás produzir até 5 bilhões de barris de óleo equivalente em áreas do pré-sal da bacia de Santos, em troca de ações da empresa.
    O objetivo da criação da cessão onerosa foi o de garantir a primazia da Petrobrás na exploração de recursos estratégicos (petróleo e gás) e permitir que o país se apropriasse da chamada “renda petroleira”, isto é, o elevado excedente econômico possibilitado pela exploração do óleo. A Lei de Partilha, aprovada em 2010, após o anúncio do pré-sal, a maior descoberta de petróleo do milênio, pretendia investir todo o dinheiro dos royalties do petróleo em educação (75%) e saúde (25%). Além de aplicar uma parcela significativa no combate à pobreza e em projetos de desenvolvimento da cultura, do esporte, da ciência e tecnologia, do meio ambiente, e adaptação às mudanças climáticas. A riqueza do pré-sal era conhecida, nesse período como o “passaporte para o desenvolvimento” do Brasil.
     A ideia que estava por detrás da gestão da riqueza do petróleo, na lei de Partilha, era garantir que o ciclo do pré-sal, fruto de décadas de sangue, suor e lágrimas do povo brasileiro, através da Petrobrás, levasse ao desenvolvimento com distribuição de renda. Um sonho antigo dos nacionalistas que se sacrificaram na campanha de “O petróleo é nosso”. Como nos ensinam os especialistas, para que a renda petroleira sirva aos interesses da maioria da sociedade, ou seja, se converta em desenvolvimento econômico e social em benefício da população, as decisões capitais sobre a exploração, a produção e a pesquisa do petróleo, têm que estar centralizadas nas mãos do governo. Claro, garantindo-se mecanismos de controle por parte da sociedade. Do contrário, ao invés do petróleo ser uma alavanca do progresso de uma população, torna-se uma “maldição”, ao levar o país a depender exclusivamente da exportação de petróleo bruto, garantindo o abastecimento (e o desenvolvimento) dos países centrais e industrializados.
     Quem não entender que as políticas adotadas em relação ao petróleo, nos governos vigentes até 2016, foram a principal causa econômica do golpe de Estado, terá imensas dificuldades para entender o que acontece no Brasil de hoje. A aprovação da Lei de Partilha, em 2010, que previa a destinação de recursos bilionários para políticas públicas de educação e saúde, que poderiam colocar o Brasil em outro patamar de desenvolvimento, foi demais para os países imperialistas. Possivelmente, naquele momento resolveram intensificar o ritmo da conspiração para o golpe que adveio em 2016.
      A única forma de garantir a soberania nacional na questão do petróleo seria exercer a opção de contratar diretamente a Petrobras para realizar a produção e extração do petróleo nos campos de cessão onerosa. Quando a lei foi elaborada, um dos objetivos era o de exatamente garantir o controle, por parte dos brasileiros, da riqueza do pré-sal. Objetivo este que foi atropelado pelo  golpe e seus desdobramentos. Há no Brasil uma grande ilusão de que os ataques aos direitos e à soberania, irão cessar e de que as próximas eleições recuperarão a democracia e colocarão o país nos “eixos”. Acredito que a história recente do subcontinente mostra que essa interpretação é um erro. O processo atual mistura dois elementos simplesmente explosivos: gravíssima crise do sistema capitalista e guerra pelo petróleo. Essa combinação torna o caso extremamente “furioso”, conforme a definição de Monteiro Lobato, na década de 1940, quando falava da luta travada pela posse do petróleo no mundo.
  *Economista.
                                                                                                   05.11.19.

Nenhum comentário:

Postar um comentário