*José
Álvaro de Lima Cardoso
Os jornais noticiam que o setor empresarial está descrente da retomada
do crescimento da economia, neste ano. Já estão falando que pode haver retomada
apenas em 2020, especialmente no setor industrial. O discurso hipócrita de que
seria só aprovar a “reforma” da previdência, para a economia deslanchar, tão
propalado por Paulo Guedes, também já caiu em descrédito. Lideranças empresarias
avaliam que “nem a aprovação da reforma da Previdência conseguiria mudar o
cenário a esta altura”.
O desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) no quarto trimestre do ano
passado (expansão de apenas 0,1% em relação ao trimestre imediatamente anterior),
já predizia que o crescimento neste ano continuaria sofrível, apesar da
tentativa de se criar um clima artificial de euforia com o novo governo. Os
sintomas do fenômeno começam agora a aparecer com maior nitidez. Nos primeiros
meses do ano, por exemplo, os estoques das fábricas voltaram a expandir. No mês
de fevereiro, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI) o estoque
efetivo das empresas em relação ao que foi previsto subiu, atingindo o nível
mais alto desde setembro de 2018. Estoques maiores de mercadorias revelam uma
produção acima da demanda, o que significará um ajuste nos próximos meses, ou
seja, uma produção menor.
A economia brasileira cresceu
1,1% em 2018 em relação ao ano anterior, tendo chegado ao mesmo patamar do PIB que
apresentava no primeiro semestre de 2012. Nos anos de 2015 e 2016, o PIB tinha apresentado
variação negativa de -3,5% e de -3,6%, respectivamente. Em 2017 o crescimento
foi de 1,1% em 2017. Um dos efeitos de um dos piores desempenhos do PIB da
história do Brasil (senão o pior) foi o agravamento da situação no mercado de
trabalho. Vamos lembrar que em 2017, uma das lorotas que os golpistas contavam
era a de que, a partir da contrarreforma trabalhista, aprovada em 11 de
novembro de 2017, o mercado de trabalho iria viajar em céu de brigadeiro.
O fato concreto é que desde o golpe em 2016 o mercado de trabalho só se
deteriora. Segundo o IBGE, a taxa de desocupação ficou em 12,4% no último
trimestre (até fevereiro), enquanto era de 11,6% no trimestre anterior. Isso
representa 13,1 milhões de brasileiros desempregados, ante 12,2 milhões de
desempregados no trimestre anterior, um crescimento assustador em tão pouco
tempo. A taxa de subutilização (trabalhadores desocupados + os que trabalham
menos de 40 horas semanais + os que estão disponíveis para trabalhar, mas não
conseguem procurar emprego por diversos motivos), chegou a 24,6%. Esta taxa, a
mais alta da série histórica, que é calculada pelo IBGE desde 2012, significa
que 27,9 milhões de brasileiros se encontram na situação de subutilização de
suas capacidades. Este dado não é brincadeira: foi constatado um crescimento de
mais de 901 mil pessoas nessa situação em relação ao trimestre anterior. Como
já se previa, o número de trabalhadores sem carteira assinada caiu -4,8% no
trimestre encerrado em fevereiro em comparação com o anterior.
Esse é um dos problemas definitivos dos
governos que chegaram ao poder em processos de golpes de Estado. Condução
econômica requer um determinado grau de legitimidade, os chamados “agentes
econômicos” têm que ter um mínimo de confiança no governo. Nos países onde
houve golpes recentes, como no Brasil, a retomada do crescimento é muito difícil,
em função da total ausência de credibilidade dos governos. No caso do Brasil a
situação se agrava pela total incompetência do núcleo de poder para uma ação
política mais eficaz. Crescimento de um 1% num país que já está estagnado há vários
anos é gravíssimo. O fato de que a economia, desde o golpe em 2016, não engatou
um ciclo de crescimento, por modesto que fosse (uma promessa dos golpistas),
seria fundamental para a consolidação do processo.
Se a economia estivesse crescendo e
gerando empregos, o governo Bolsonaro, mesmo sendo resultado direto de uma
fraude, poderia angariar alguma legitimidade para realizar aquilo para o qual
lá foi colocado: aprofundar as ações do golpe de 2016, no referente ao fim da
soberania e destruir os direitos sociais e trabalhistas que Temer não conseguiu
destruir, em seus 2,5 anos de governo. Para continuar tendo o apoio dos setores
que o colocaram lá (principalmente Império e sistema financeiro internacional),
Bolsonaro precisará implementar uma política de desmonte de tudo que é público
e que signifique algum benefício concreto para a população.
Um aspecto fundamental na análise, e que não
aparece na fotografia, é a crise internacional do capitalismo, que se arrasta
há anos, e que obriga golpes de Estado na periferia do sistema, forçando
transferências crescentes de riqueza para os países capitalistas centrais. O
governo Bolsonaro, crivado desde o início por denúncias de corrupção e
desmandos, poderá se sustentar através da implementação do programa econômico
de guerra contra a população. A unidade dos golpistas que sustentam o governo
está na realização do referido programa, cuja primeira grande medida é a
entrega da previdência social para os bancos.
O que gera empregos são políticas de
crescimento, projetos de desenvolvimento, preservação da qualidade de vida,
preservação do patrimônio nacional, valorização do povo em todos os sentidos,
etc. Se estão aumentando o grau de exploração de uma população que já é super
explorada, obviamente o que pode ser gerado são empregos de péssima qualidade.
Como vem ocorrendo no Brasil, a partir da aprovação da contrarreforma
trabalhista em 2017. Se o governo vem
destruindo salários, mercado interno, indústria, entregando estatais a preço de
banana, entregando o Pré-sal, entregando a Base de Alcântara, porque o mercado
de trabalho iria gerar empregos que fomentasse o consumo e a produção
industrial?
Não é possível acender uma vela para deus
e outra para o diabo. Se Bolsonaro foi colocado no poder, como se sabe, para ajudar
os grandes capitais internacionais a enfrentar a queda de seus lucros e a crise
mundial do capitalismo, não poderá, ao mesmo tempo, melhorar a vida do povo
brasileiro. Por isso o nível de desemprego está crescendo, os salários reais
estão em queda, e a miséria está aumentando a olhos vistos. Isso num país onde
os salários médios no setor privado formal totalizam pouco mais de R$ 1.500,00
e quase cinquenta milhões de brasileiros dependem do Programa Bolsa Família
para não passar fome. Os programas sociais, aliás, estão sendo desmontados, em
nome da austeridade fiscal. Paulo Guedes e sua equipe têm uma missão, sobre a
qual pouco conseguem disfarçar, que é terminar de entregar o país para o
sistema financeiro e grandes grupos multinacionais, que não têm nenhum
compromisso com projeto nacional ou o bem-estar da população.
Este golpe segue, como no de 1964, um
roteiro criminoso, visando inviabilizar o Brasil enquanto nação soberana,
transformando o país em mero provedor de matérias-primas para o mundo
desenvolvido e, ao mesmo tempo, transformar o país em importador de derivados
do petróleo e de produtos industrializados em geral. Os que comandam o golpe
estão impondo uma política que vai contra 99% da população brasileira. Entre os
que moram no país apenas os super ricos podem apoiar essas políticas, porque
vivem de rendas e não do trabalho. Toda a política encaminhada pelos governos
golpistas significa retirada de direitos e rapinagem das riquezas do país.
Neste golpe - como no de 1964 e em todos que vitimaram o Brasil - o povo não
tem nada para comemorar.
*Economista.
31.03.19.
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