*José Álvaro de Lima Cardoso
Nos últimos anos o tabuleiro conjuntural nacional
se tornou muito mais complexo, em função do emaranhado de fatores internos e
externos ao país. Em decorrência da confluência de vários elementos, o Brasil
ficou no centro de uma guerra de interesses, que envolve petróleo, água, terras
férteis, outros minerais fundamentais, e geopolítica. No quadro da maior crise mundial
do sistema capitalista e de uma das maiores crises econômicas da história do
país, adveio o golpe de Estado. O que chama mais atenção nesse golpe, mais
talvez do que em todos os anteriores, é a intensidade e a dramaticidade dos acontecimentos.
De 2013 para cá, período
em que a história “acelerou o passo”, em função dos impactos da crise e da
construção do golpe, fatores mutuamente potencializados, ocorreu uma sensível
piora do quadro conjuntural político e econômico. O processo, que foi operado por vários
grupos de interesses, mas comandado pelo imperialismo, vem mudando
profundamente a relação do Estado com a sociedade. Em dois anos destruíram a
legislação trabalhista, desmontaram a democracia, aumentaram a pobreza e a
fome, entregaram o pré-sal e liquidaram a soberania nacional. É a chamada “política
de choque”, que encaminha o que for possível de um “catálogo de maldades”, de forma muito veloz, justamente para evitar
reação da sociedade. Esse catálogo só não foi inteiramente implantado até agora
porque houve reação da sociedade, como no caso da destruição da Previdência
Social. Isso não quer dizer que não consigam, pois o momento é de perplexidade
e tentarão de todas as formas completar o serviço. A tentativa neste momento é
de institucionalização do golpe, que enfrenta percalços em função da reação
da população, que é insuficiente, mas inesperada para os seus estrategistas.
Um dos objetivos do processo no Brasil foi
suavizar para os países imperialistas, os
efeitos da crise econômica mundial. A voracidade das multinacionais sobre as
riquezas brasileiras (petróleo, água, minerais em geral, terras férteis,
estatais estratégicas) que sempre foi muito grande, com o golpe ficou
escancarada. O Estado nacional também vem sendo enfraquecido e de todas as
maneiras: congelamento de gastos primários por 20 anos, privatizações ou
sucateamento de setores estratégicos, destruição dos mecanismos de crédito, etc.
Mas o que está sendo desmontado é principalmente o Estado público, aquele que,
com muitas limitações desempenha funções públicas nas áreas do crédito, da
assistência social, da previdência, etc. Ao mesmo tempo o Estado foi colocado
sem intermediações, e de forma descarada, à serviço do capital privado,
especialmente o financeiro.
Em função da crise de hegemonia, e da
disputa geopolítica e militar encarniçada com China e Rússia, os EUA intensificaram
sua ofensiva contra governos populares e nacionalistas (de diferentes matizes)
de toda a América do Sul. Para melhor travar sua disputa ao nível mundial o
Império precisava alinhar os governos da Região. Os processos em Honduras
(2009), Paraguai (2012) e Brasil (2016) são os acontecimentos que mais chamam a
atenção pelo fato de serem golpes de Estado, e com grandes semelhanças
(coalização do dinheiro/mídia/judiciário, e outras). Mas outras investidas têm
sido encaminhadas e combinadas, como o uso do lawfare (guerra
travada por meio da manipulação das leis para atingir alguém que foi eleito
como inimigo
político) em todo a Região. Pelo domínio da máquina de propaganda em cada país e da grande
profusão de recursos, mesmo quando não há golpe de Estado aberto, o Império vem
colocando na defensiva, governos democraticamente eleitos.
Uma
mirada rápida sobre o Oriente Médio pode ajudar a entender a conjuntura
nacional e internacional. A Síria, no dia
14.04, sofreu um ataque de três dos principais países imperialistas (EUA, Reino
Unido, França), com base numa mentira já bastante surrada, o suposto uso de
armas químicas por aquele país contra sua população civil, na cidade de Duma. O que os países imperialistas não conseguem explicar é qual a lógica, para
um governo que praticamente acabou de ganhar uma guerra, realizar um ataque
químico que fatalmente iria chamar para si um confronto com os EUA e seus asseclas.
Ficou tão evidente que o suposto ataque químico do governo sírio era apenas um
pretexto para um ataque covarde, que o Conselho de Segurança da ONU não apoiou
a versão do governo dos EUA, e recomendou
uma saída política para a questão, e não militar. Claro, a posição da ONU de
nada adiantou porque a acusação era apenas um pretexto para revidar a derrota
recente que o imperialismo sofreu na Região.
No caso da Síria, os países agressores não
admitem a perda de um ponto tão estratégico no tabuleiro da geopolítica mundial
e resolveram revidar, atacando uma cidade com população semelhante à Curitiba
ou Recife. Possivelmente com a intenção de abrir um novo ciclo de guerra, algo sempre
tão almejado pela indústria bélica mundial. No caso do Brasil não foi
necessário contratar mercenários e fazer uma guerra por procuração, como na
Síria. No Brasil não foi preciso a utilização de mísseis para tomar o pré-sal,
água, setor elétrico e demais riquezas. Bastaram as técnicas de semiótica
largamente utilizadas pela CIA, o uso de parlamentares entreguistas, e de
amplos setores do judiciário e da mídia subserviente.
*Economista.
(17.04.18)
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