Por Luciano Martins Costa
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 16/12/2014
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 16/12/2014
Os jornais fazem um retrato tenebroso da situação em que se encontra a
Petrobras, um mês depois de revelada a extensão das negociatas que
envolveram políticos, dirigentes da estatal e grandes empreiteiras que
fazem parte de sua constelação de negócios. Os números são tão
grandiosos que o leitor é incapaz de imaginar o volume de dinheiro
desviado em negócios superfaturados.
O resultado é que, quanto mais atenção coloca no noticiário, menos
capaz fica o cidadão de abranger todo o contexto. Na terça-feira
(16/12), porém, surge uma ponta da meada que permite entender a lógica
da imprensa: com seu valor reduzido seguidamente por conta do escândalo,
sob ameaça de ações judiciais nos Estados Unidos e no Brasil, e ainda
sob risco de ver seus principais fornecedores serem condenados e
proscritos, analistas começam a afirmar que a estatal estaria
impossibilitada de seguir explorando a reserva de pré-sal (ver aqui e aqui).
Como se sabe, os 149 mil km2 da província do pré-sal apresentam uma
taxa de produtividade muito acima da média mundial e já são a fonte de
quase 30% de todo o óleo extraído pela empresa. Feita a projeção de
crescimento dos atuais 550 mil barris por dia em 25 poços produtores,
daqui a três anos, com quase 40 poços ativos, o pré-sal deverá suprir
52% da oferta de petróleo no Brasil.
Num cenário em que o preço internacional do óleo cai abruptamente,
cresce o valor estratégico da empresa brasileira justamente pelo fato de
estar próxima de dar ao Brasil a oitava maior reserva do mundo, com 50
milhões de barris ou mais, qualificando o país como protagonista no
setor.
Qual era a vantagem estratégica da Petrobras em relação às demais
gigantes do setor? Exatamente o fato de possuir suas principais áreas de
exploração em uma região sem conflitos militares, sem instabilidade
política e plenamente conformada às normas e regulações internacionais.
Até mesmo os riscos ambientais alardeados na década passada, quando foi
anunciada a decisão de explorar as reservas de alta profundidade, foram
desmentidos com o tempo.
O escândalo envolvendo a empresa a torna vulnerável a ataques de todos
os tipos, mas principalmente abre caminho para as forças que têm
interesse em alterar o marco regulatório do pré-sal.
Interesses poderosos
Há corrupção nos negócios da Petrobras? Certamente, muito do que tem
sido noticiado nos últimos meses acabará sendo comprovado, mas há um
aspecto que não vem sendo considerado pela imprensa: a corrupção é parte
do processo de gestão do setor petrolífero em todo o mundo e, no caso
presente, a estatal brasileira se encontra no papel de vítima. Portanto,
há uma distorção no noticiário que esconde muito mais do que o
propósito de expor a relação deletéria entre negócios e política.
Embora os contratos de partilha do óleo de grande profundidade sejam
geridos pela empresa Pré-Sal Petróleo S.A, criada como subsidiária da
Petrobras para executar o novo marco regulatório, a operadora do sistema
é a Petrobras. Cabe à estatal criada por Getúlio Vargas o ônus do
processo de depuração que está em curso com as investigações que ocupam
diariamente as manchetes dos jornais. Embora a maior parte dos danos
seja debitada na aliança que governa o país desde 2003, principalmente
ao Partido dos Trabalhadores, é o modelo do negócio que corre risco.
É pouco conhecido o fato de que a Petrobras não se tornou uma estatal
com o novo marco regulatório: apenas 33% do capital pertencem ao Estado,
e 67% estão em mãos privadas. O que mantém o controle da empresa em
mãos do Estado é o fato de que este controla metade mais uma do total de
ações com direito a voto, o que preserva a Petrobras como sociedade de
economia mista.
Não é, então, a condição legal da empresa que pode mover interesses
poderosos, mas o sistema de exploração do pré-sal: pelo modelo antigo,
de concessão, as companhias concessionárias podiam fraudar facilmente os
custos de extração, reduzindo a parcela a ser paga tanto em royalties
ao Tesouro quanto em barris de petróleo a serem entregues ao sistema de
refino e distribuição. O modelo de partilha, criado pelo novo marco
regulatório de 2009, mantém sob controle mais rigoroso o usufruto dessa
riqueza natural por parte do Brasil.
O bombardeio constante e diário de notícias sobre a corrupção esconde outros aspectos desse jogo.
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