*José Álvaro de Lima Cardoso
Pressionado pelo Tribunal de
Contas da União (TCU), que abriu procedimento para apurar um caso grave de
conflito de interesses, o suspeitíssimo ex-juiz Sergio Moro declarou que, em um
ano, recebeu R$ 3,5 milhões da Alvarez & Marsal, empresa que ganhou
dinheiro com a quebra de empresas brasileiras, através de decisões da Lava Jato,
ou seja, do próprio Sérgio Moro. Segundo informações da imprensa, ele recebeu
US$ 656 mil nos doze meses de contrato com a consultoria, no período de 23 de
novembro de 2020 e 26 de novembro de 2021. Pelo câmbio do dia 28.01, esse valor
representa R$ 3,537 milhões, nada menos que R$ 294.750 por mês. A consultoria
estadunidense Alvarez & Marsal atua nos processos de recuperação judicial
de empresas envolvidas na Operação Lava Jato.
O “honestíssimo” Sérgio Moro,
que colocou o ex-presidente Lula na cadeia por quase dois anos, sem sequer uma
prova de crime, além do salário de R$ 241,9 mil, recebeu um bônus de US$ 150
mil pela contratação (R$ 806 mil). Os ganhos em um ano, portanto, estão acima
de R$ 3,5 milhões. Esses valores milionários são aquilo que Moro está
declarando. Quem acompanha a operação Lata Jato desde o início, conforme
inclusive revelaram as denúncias da Vaza Jato, sabe que Sérgio Moro é um
mentiroso completo e contumaz.
Levantamento do TCU, com base
no levantamento de documentos sigilosos, revelam que a Alvarez & Marsal faturou
R$ 65 milhões de empresas investigadas na Lava Jato. Esses valores representam 77,6%
dos ganhos da empresa no Brasil. Moro, na posição de juiz condenou
executivos de empresas que são clientes da Alvarez & Marsal no processo de
recuperação judicial. Fora do cargo de juiz, foi contratado pela empresa que
presta serviços às empresas cujos executivos foram condenados por Moro. Tinha
informações privilegiadas, fundamentais para a atuação da Alvarez & Marsal
no processo de recuperação judicial. Se esses fatos não forem considerados
suspeitos e caracterizarem evidente conflito de interesses, o que mais poderiam
ser? O fato de Moro ter se empregado por salário milionário, em uma empresa com
interesses diretos nas informações do ex-juiz Moro, em pleno andamento dos
processos de julgamento da Lava Jato, revela inclusive a elevada confiança de
que nada lhe poderia acontecer, em função de suas “costas quentes”.
Que tipo de competência
profissional, Moro, que não sabe nem se expressar direito em português, poderia
aportar à uma empresa de renome internacional? A Alvarez & Marsal, na
realidade comprou as informações privilegiadas que Moro possuía na condição de
juiz, já que ele tinha acesso a todos os documentos, na medida em que aprovava
os acordos de leniência, colaborações premiadas, e outros ritos legais.
Desde que apareceu na cena
nacional, como um “paladino da moralidade” a trajetória de Moro é caracterizada
por crimes recorrentes. Sem dúvida o maior deles foi ter sido o protagonista, a
serviço dos EUA, de uma engrenagem fundamental para um dos maiores crimes
contra o Brasil, que foi o golpe de 2016. Com o golpe, a desgraça desabou sobre
o Brasil, com 7 anos seguidos de estagnação ou recessão e explosão da pobreza e
da fome. A Operação foi fundamental tanto para o impeachment em 2016, quanto
para a fraude eleitoral de 2018. Foi a ponta da lança que feriu de morte a
democracia brasileira nos dois momentos. A Lava Jato se apresentava como a
maior operação anticorrupção do mundo, mas se transformou no maior escândalo
judicial da história brasileira.
É difícil entender porque a Lava Jato,
cujos protagonistas faziam o que bem entendiam e prendiam quem quisessem, caiu
em desgraça. Para compreender o fenômeno, temos que considerar que: a) o complô
que perpetrou o golpe no Brasil é bastante amplo e tem suas contradições
internas (supremo, militares, império norte-americano, políticos e empresários corruptos,
extrema direita, etc.); b) a Operação era para pegar somente a esquerda, mas
começou a trazer provas contra os próprios golpistas e seus amigos; c) não
existe crime perfeito, ainda mais neste nível de abrangência, envolvendo um
país-continente; d) no Brasil houve reação contra o golpe, ao contrário de
outros países na América Latina. Aqui tivemos um dos maiores fenômenos
políticos da história mundial que foi o acampamento Lula Livre, montado em
Curitiba, que permaneceu enquanto durou a prisão, quase dois anos, sob chuva,
sol, atentados e toda sorte de dificuldades.
Quando surgiram as denúncias
da Vaza Jato, em 2019, num determinado momento, enquanto o país aguardava mais
um capítulo da série “The
Intercept Brasil – As Mensagens Secretas da Lava Jato”, Sérgio
Moro viajou para os Estados
Unidos, como Ministro da Justiça e Segurança Pública, para “fazer visitas técnicas a instituições”.
Pego vergonhosamente com a boca na botija, foi tomar orientações dos seus
chefes nos EUA. Os diálogos vazados tanto na Vaza Jato, quanto no material
divulgado pelo hacker Walter Delgatti Neto, em 2019, mostram confissões de
verdadeiros crimes contra o país, contra as leis, contra a soberania nacional,
contra a honra das pessoas. Ficou muito evidente que a operação não era contra
o crime, mas era ela mesmo uma operação muito criminosa.
O combate a corrupção era
apenas uma cobertura, uma fachada. Deram o golpe para tirar a esquerda do poder
por motivos políticos e econômicos, a serviço de uma potência estrangeira. A
esquerda no poder (mesmo moderada e negociadora) estava atrapalhando as
necessidades do capital internacional de tirar proveito, por exemplo, das
descobertas do pré-sal, anunciadas pela Petrobrás em 2006. Exemplo disso foi a
lei de Partilha, que retinha uma parte maior da renda petroleira no país, e que
sofreu grande oposição por parte das multinacionais. Isso tudo colocou a
“necessidade” do golpe no Brasil, para interromper um governo de esquerda e
suas reformas inconvenientes.
Os prejuízos que a Lava Jato
causou no campo da democracia e do Estado de Direito são incalculáveis. Sérgio
Moro, um dos maiores responsáveis por esse processo, aproveitou a operação para
enriquecer, às custas da explosão da fome e da pobreza no país, decorrências do
golpe. Mas não foi só a democracia que foi destruída. Conforme estudo do
DIEESE, por conta da farsa montada com a Lava Jato, R$ 172,2 bilhões deixarram de ser investidos no
País, soma equivalente a 40 vezes os R$ 4,3 bilhões que a Lava Jato informa
recuperado para os cofres públicos.
A Lava Jato, que visava atingir a maior
empresa do Brasil e da América Latina, levou a uma crise inusitada no setor de
petróleo e gás, e a uma queda drástica da taxa de investimentos no país. Os
estadunidenses quando perceberam que podiam quebrar, além da Petrobrás, o
entorno da empresa, a rede de empresas fornecedoras, não tiveram dúvidas.
Petróleo e gás, e construção civil brasileira concorriam diretamente com as
empresas norte-americanas. Mais tarde fizeram a operação “carne fraca” para desmontar
a indústria da alimentação do Brasil.
Não podemos perder de vista que
Sérgio Moro é apenas um peão, um testa-de-ferro, um aventureiro em busca de
poder e enriquecimento. Quem comanda esse processo é o maior poder da Terra, o
imperialismo mundial (liderado pelos EUA). É importante entender que a
estratégia dos EUA para a América Latina é impedir o surgimento de potências
regionais, especialmente em áreas com abundância de recursos naturais, como é o
caso do Brasil. O modelo dos norte-americanos, proposto para a região é o de
países com Forças Armadas limitadas, incapazes de defender suas riquezas
naturais, como é o Brasil de hoje.
A partir do anúncio do pré-sal
pelo Brasil, em 2006, os EUA reativaram a 4ª Frota Naval, dedicada a policiar o
Atlântico Sul e rejeitaram a resolução da ONU que garantia o direito brasileiro
às 200 milhas continentais. A proposta dos americanos, e dos entreguistas,
sempre foi tirar a Petrobrás do caminho e possibilitar às multinacionais do
petróleo a apropriação dos bilionários recursos existentes no pré-sal que, no
limite, podem chegar a quantidades próximas à Venezuela e Arábia Saudita. A
primeira prisão que a Lava Jato efetuou foi a do contra-almirante Othon Silva,
considerado o pai da energia nuclear no Brasil. Acusaram ele de corrupção e o
botaram na cadeia ainda em 2015. O juiz que o colocou na cadeia é da Lava Jato
do Rio de Janeiro, uma espécie de sub Moro, um fascista que posava pra revistas
da moda, portando um fuzil.
Quando a Petrobrás anunciou o
pré-sal, os críticos, bafejados pelas multinacionais do petróleo, diziam que o
petróleo naquelas profundidades não teria viabilidade comercial. Chegaria tão
caro na superfície, em função do custo de extração, que não teria viabilidade
comercial. Hoje os custos de extração do barril do petróleo, do pré-sal, está a
US$ 5, praticamente o custo da Arábia Saudita que retira petróleo, bem dizer, à
flor da terra. Os Estados Unidos para continuar na condição de potência,
dependem crescentemente dos recursos naturais da América Latina e, por esta
razão, não quer perder o controle político e econômico da Região. Daí a
sucessão de golpes em toda a América Latina nos últimos 12 anos.
Uma das lições do golpe no
Brasil, que infelizmente nem todos aprenderam, é que se a gente quiser viver em
um país soberano tem que construir as condições geopolíticas e militares para
isso. Especialmente neste momento em que a crise empurra os EUA para uma
política abertamente agressiva contra seus inimigos, como podemos assistir nos atuais
conflitos na Ucrânia e Taiwan. É importante considerar também que Moro é apenas
um peão nesse complexo tabuleiro. Um peão muito bem pago, é verdade (conseguiu,
pelo menos, alguns milhões), mas um simples capacho numa cadeia muito complexa,
que chega até à cabeça do imperialismo. A lição do golpe foi muito dura, mas muito
rica de ensinamentos. Deveríamos aprender com eles, ou então, como diz a
canção, “a vida não vale nada”.
*Economista 31.
01.2022.