segunda-feira, 16 de outubro de 2017

O desmonte do Estado nacional.




                                                                                     *José Álvaro de Lima Cardoso.
   A operação Lava-Jato, uma farsa à serviço principalmente das multinacionais norte-americanas, divulgou que, nas investigações realizadas, teria apurado desvios totais da ordem de R$ 6,2 bilhões. Este número está obviamente superestimado, mas o aceitemos para efeito de análise. Para reaver essa suposta quantia, a operação provocou um rombo estimado em 2,5% do PIB em 2015 e percentual semelhante em 2016. Somente em 2015 a perda do PIB provocado pela forma como foram conduzidas as investigações equivaleu, portanto, a uma perda de riqueza na casa dos R$ 140 bilhões de reais. Somente o perdão de impostos concedidos pelo Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), ligado à Receita Federal, ao banco Itaú, relativos à fusão Itaú/Unibanco realizada em 2008, representou um valor mais de quatro vezes superior. O valor do benefício concedido ao Itaú, em um ano em que o Brasil terá o maior déficit fiscal da história, é de R$ 25 bilhões (quase o orçamento do Bolsa Família). Essa era uma fatura do golpe, evidentemente.
     Em 2015 e 2016 o mercado de trabalho brasileiro perdeu quase três milhões de empregos formais (de carteira assinada) em decorrência da crise, extremamente agravada pelo golpe e pela Lava-Jato. Boa parte destes empregos eram da construção civil, setor que foi quase dizimado pelo processo. Vale lembrar que um dos objetivos do golpe foi a destruição do setor de engenharia nacional, o que abre espaços para os capitais norte-americanos.
     A contrarreforma trabalhista que entra em vigor em novembro, significará uma transferência de riqueza da classe trabalhadora para as empresas, especialmente as grandes, como nunca foi visto na história do Brasil. A aplicação das regras da referida lei, na prática da negociação coletiva, conduzirá à uma elevação da pobreza, em um nível que possivelmente jamais tenhamos assistido. Comparados com o roubo de renda e salários da nova lei trabalhista, os valores estimados como provenientes da corrupção no Brasil, que tanto ocupou a farsa da Operação Lava-Jato, representarão meros “trocados”. Isso sem considerar todo o conjunto de atrocidades que está sendo cometido contra o país, em todas as áreas.
     Esse tipo de corrupção, levada às últimas consequências pelo golpe, é a grande corrupção, porque é consequência da exploração do capital sobre os trabalhadores e da captura do Estado pela elite do Dinheiro, especialmente a financeira. O golpe no Brasil veio para radicalizar as transferências de recursos da sociedade para o capital, nacional e internacional. Não é por acaso que a coordenação da espinha dorsal das medidas implementadas pelo governo ilegítimo, ficou ao encargo de um mandatário dos banqueiros internacionais, Henrique Meirelles, auxiliado por uma equipe, visceralmente ligada aos bancos também. A missão de Meirelles, é implementar de forma radical as políticas definidas pelo Consenso de Washington, prescrição dos países ricos para as nações periféricas.
     Uma das principais políticas do Consenso de Washington, a privatização do maior número possível de estatais, está sendo rapidamente encaminhada pelos golpistas. Estão fatiando a Petrobrás, encaminham a privatização do Sistema Eletrobrás (inclusive já venderam recentemente quatro unidades em Minas Gerais), estão preparando também os bancos federais para privatização, com demissões em massa e fechamento de agências. Como logicamente iria acontecer, os ataques chegaram á Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), reconhecida no mundo por sua excelência no desenvolvimento de pesquisas, que ajudaram a tornar o Brasil um dos maiores produtores agropecuários do mundo. Sem a realização de concursos, a empresa vem sofrendo seguidos cortes do orçamento numa política evidente de inviabilização do seu funcionamento.
     Segundo denúncias dos seus funcionários, o governo encaminhou um projeto de lei, 5234/2016, que autoriza a companhia a criar uma subsidiária integral, denominada Embrapa Tecnologias Sociedade Anônima, a EmbrapaTec. Essa subsidiária, terá por objetivo social a negociação e a comercialização das tecnologias, dos produtos e dos serviços desenvolvidos pela Embrapa e outras instituições científicas, tecnológicas e de inovação, e a exploração dos direitos de uso das marcas e dos direitos de propriedade intelectual deles decorrentes, de modo a promover a disseminação do conhecimento gerado em benefício da sociedade.
     Uma das justificativas da diretoria da Embrapa, para a criação da subsidiária, é que o Estado não tem dinheiro para financiar a pesquisa, por isso precisa ir para o mercado para se financiar. Um dos argumentos do representante da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), para a defesa da criação da subsidiária, foi o de que o retorno do investimento em ciência e tecnologia é elevado e de efeito moroso. Portanto, para os dirigentes da CNA, as empresas, deveriam utilizar a estrutura da Embrapa (campos experimentais, laboratórios e recursos humanos de excelência), sem a necessidade de montarem próprias estruturas. 
     Uma das denúncias dos funcionários da Embrapa é que o grande motivador deste processo de ataques à companhia tem como “jogo oculto” o acesso das grandes multinacionais do setor agropecuário e florestal ao banco genético brasileiro, criado e mantido pela Embrapa. Este banco genético está avaliado em mais de US$ 1 bilhão e “conserva material estratégico para a soberania nacional na pesquisa agropecuária e florestal (com não menos importância para a pesquisa médica e farmacêutica), para a mitigação e a adaptação de cultivares agrícolas em um cenário crítico de mudanças climáticas, e para a segurança alimentar e nutricional da população brasileira. O banco genético é tão importante para o país que pode ser considerado o “banco central” da agricultura brasileira”[1].
     Como denuncia o artigo mencionado, os riscos de entregar o banco genético são incalculáveis, pois três empresas multinacionais dominam o mercado de sementes no Brasil. Um mercado que equivale, simplesmente, a um terço do mercado mundial, de cerca US$ 30 milhões ao ano. O enfraquecimento da Embrapa é totalmente coerente com o objetivo do golpe, de retirar a capacidade de ação, externa e interna, do Estado brasileiro, em todas as áreas. Ajuda também a impedir a retomada da industrialização, para a qual a pesquisa em setores estratégicos, é fundamental. Se o objetivo é tornar o país uma plataforma de matérias primas, e disponibilizá-las para as multinacionais por baixo preço, não precisa estatal com excelência ou pesquisa estratégica.
                                                                                                            * Economista.


[1] Do artigo O golpe chegou à Embrapa, assinado com o pseudônimo Ana Guerra. O autor (a), prudentemente, usou um pseudônimo para evitar represálias por conta de suas opiniões sobre a atual situação da Embrapa.


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