Sensor publica editorial de Mino Carta, de Carta Capital, transcrito do Conversa Afiada.
O bestialógico galopa enquanto um criminoso decide o destino do Brasil. Mas há um problema mundial...
O
escândalo chamado Panama Papers cabe com encaixe perfeito entre os
resultados da sujeição do mundo ao deus mercado que o papa Francisco
mais propriamente definiria como demônio do dinheiro.
Antes de
cogitarmos de uma reforma política brasileira, de resto, por ora tão
improvável quanto duvidosa, seria altamente recomendável uma reforma do
globo terráqueo. De sorte a reverter o processo destinado a enriquecer
cada vez mais uns poucos para empobrecer e imbecilizar os demais. Aludo a
bilhões de seres ditos humanos.
Um jurista italiano em recente
visita ao Brasil, ex-integrante da força-tarefa da Operazione Mani
Pulite, Gherardo Colombo, convidado com o transparente propósito de
constatar convenientes similitudes entre aquela ação justiceira e a Lava
Jato, cuidou de desencantar os anfitriões, de sorte a não merecer maior
repercussão na mídia nativa, a do pensamento único a favor do golpe.
A
tese central de Colombo, exposta no debate promovido para favorecer
Sergio Moro e os promotores curitibanos, é a seguinte: em situações de
corrupção desenfreada, a magistratura terá de agir para prender e
incriminar quem quer que seja, mas não extirpará o mal se este for da
cultura do país. O pecado só será remido pela educação dos graúdos e dos
miúdos. Dura lição, que não se coaduna com as pretensões da Lava Jato.
A
corrupção é global, como, por exemplo, os Panama Papers comprovam. Nem
por isso Moro e sua operação deixam de ser representativos de um país a
seu modo único. A Lava Jato presta-se a fornecer munição a uma tentativa
de golpe, vale-se de uma polícia disposta a desservir ao Estado para
favorecer a manobra em sintonia com a mídia compactamente envolvida no
processo.
Atenta contra a lei impavidamente e tanto esquece a
origem da corrupção e seus mais atilados praticantes, bem como liquida
em um piscar de olhos a possibilidade de qualquer envolvimento da
Mossack.
Desponta a urgência de interrogar os botões: por que
será que Moro e cia. enterraram o assunto? Respondem: talvez o peso de
nomes graúdos detentores das offshore à margem do canal, nomes
retumbantes, tenha aconselhado o súbito recuo, mesmo depois da prisão de
cinco suspeitos da Mossack, logo postos em liberdade.
Uma
pergunta chama outra: e por quais cargas-d’água as atividades do
empresário Fernando Henrique Cardoso e do seu endiabrado herdeiro Paulo
Henrique não mereceram eco da mídia nativa? Ora, ora, respondem os
botões, FHC é ainda mais invulnerável do que Aquiles, o herói grego de
calcanhar indefeso. Nem mesmo Páris, de excelente pontaria, conseguiria
abater o ex-presidente sem pontos fracos.
A incerteza do momento
precipita mais perguntas. Por que ressurge a proposta da renúncia da
presidenta Dilma, formulada tempos atrás pelo acima citado FHC? A Folha
de S.Paulo ressuscita a ideia como portadora da bandeira a abrir o
desfile olímpico. Marcha imponente, a convocar muitos dos titulares da
casa-grande, seus aspirantes e fâmulos.
E por que Dilma haveria
de renunciar? Nada empurra a tanto o vencedor de uma eleição, menos
ainda a lei. Há quem diga: antecipemos as eleições, outubro próximo
seria uma boa data. A presidenta reage com louvável ironia: pois então,
renunciemos todos em bloco, governo, governadores e congressistas.
A
quem aproveita a proposta? Panorama confuso, de névoa do Mar do Norte,
na madrugada invernal. Em meio à cerração, aparecem desentendimentos na
tripulação do barco golpista. Não vale a pena perder tempo em relação ao
patético comportamento de Marina Silva, crente ferrenha das pesquisas,
incapaz de perceber que a coisa pega somente nas cercanias do pleito.
Permito-me
outros exemplos: eleições em outubro não comovem, por motivos diversos,
Michel Temer e Aécio Neves. Encantam, porém, por razões insondáveis,
Paulo Skaf, aquele que estimula imensa saudade de Antonio Ermírio de
Moraes e Olavo Setubal, dois empresários que praticaram a política com
outros méritos e válidos atributos. Tampouco está claro se Skaf é
empresário.
Algo é certo, soletram os botões: a proposta da
renúncia nasce de uma forte dúvida a respeito do desfecho da manobra
golpista do impeachment. A tigrada deu para temer, de uns dias para cá,
que o complô soçobre no fracasso final.
Retomada a normalidade
democrática, e diante de uma crise iniciada no exterior que não tende a
arrefecer, a possibilidade de antecipar eleições gerais poderia ser
levada em conta, ao cabo de um amplo debate e de uma adequada emenda
constitucional, operada pelos poderes previstos em lei.
Antecipação
de um ano, para outubro de 2017, quem sabe. Não é por acaso, de todo
modo, que a Folha assuma o papel de portador da proposta da renúncia,
inequivocamente golpista nas circunstâncias. Diz um caro amigo que o
jornalão da família Frias é o mais hipócrita da categoria.
Abriga
textos que contradizem a linha do jornal, sem contar a pretensão do
ombudsman faccioso, para alardear uma isenção desmentida na totalidade
dos demais espaços. O Estadão é um vetusto fazendeiro que não consegue
enxergar além da cancela das suas terras. O Globo é homem de negócios
suspeitos, sem escrúpulos, entregue ao demônio do dinheiro.
Os
jornalões, os revistões e os programões abrigam o bestialógico mais
grandioso da história do País. No confronto, o Febeapá da Stanislaw
Ponte Preta empalidece. O que se lê e se ouve, imediatamente repetido
por uma fatia conspícua da sociedade, é algo que não tem similar mundo
afora. Trata-se de um besteirol clangoroso que exibe o estágio cultural
primitivo de uma nação carente de saúde mental.
Não falta quem
escape ao desastre, mas o conjunto da obra é apavorante. Fôssemos
diferentes, nos riríamos dos equívocos, dos mal-entendidos, das
acusações pueris, e das pretensões descabidas, das ambições idem, dos
exibicionismos provincianos, da pompa ridícula, da ostentação grosseira,
da vulgaridade geral. O fenômeno apresenta, contudo, uma imponência tão
avassaladora a ponto de provocar por parte de quem dispõe de bons
olhos, vergonha e desalento.
Perguntam agora meus envergonhados
botões: quem haverá, neste Brasil em apuros, capaz de entender que o
impeachment não resolve a crise, pelo contrário, a complicaria? E quem
se dá conta de que os Panama Papers desvendam o ninho do ovo da serpente
da crise que, sem isentar o País, transcende a economia?
Há
outra discrepância, ainda mais espantosa, a denunciar ausência de saúde
mental, bem como política: enquanto se discute se Dilma cometeu um crime
inexistente, decide os destinos do Brasil um notório criminoso chamado
Eduardo Cunha
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